Leia entrevista com psicóloga do Projeto Criança & Consumo
Dia do Consumidor convida a reflexões sobre hábitos comuns.
Deborah DubnerPor Deborah Dubner
Para celebrar o Dia Do Consumidor, nossa equipe entrevistou Maria Helena Masquetti, psicóloga do Projeto Criança & Consumo do Instituto Alana e que assina a coluna “Infância Roubada” no itu.com.br.
Itucombr - Como o consumidor brasileiro evoluiu nas últimas décadas em relação ao consumo? Tem vontade de consumir cada vez mais? Ou a nova consciência sobre consumo e sustentabilidade já tem gerado alguns resultados?
Maria Helena - É perceptível o aumento do poder de consumo da população como um todo, no mundo inteiro. O problema é que a consciência sobre a relação entre consumo e sustentabilidade vem sendo trabalhada e ainda tem um longo caminho a ser percorrido. Existem diversas instituições, como o Instituto Akatu, que trabalham exatamente esse ponto.
Agora a questão é mais complexa quando pensamos em como o público infantil está inserido nessa lógica do mercado. A criança é vista hoje como consumidora e se tornou o público alvo de diversas estratégias e campanhas de marketing, tendo suas reações e comportamentos estudados para poderem ser mais atingidas pela comunicação mercadológica de empresas. Elas influenciam 80% das compras domésticas – e não apenas de produtos infantis - de acordo com pesquisa da Interscience de 2006.
Precisamos evoluir no tratamento e nos direitos desse público, considerado hipervulnerável pela Constituição Federal por não possuir condições de compreender e se defender da comunicação publicitária. E essa mudança de pensamento só será conseguida através da ação conjunta de pais, escolas, sociedade civil e do Governo, que precisa proteger as crianças de acordo com o que está estabelecido no Código de Defesa do Consumidor e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Itucombr - Do ponto de vista da bandeira do Criança e Consumo, qual é o maior desafio para os próximos anos?
Maria Helena - O Consumismo na Infância é uma questão que afeta a todos nós e exige esforços de todos os setores da sociedade no sentido de preservar-se a infância e proteger a criança do assédio comercial. Tanto a educação é fundamental quanto a consciência do setor publicitário de que a criança é um indivíduo em formação que, até por volta dos 10 anos de idade, não consegue entender e julgar perfeitamente o caráter persuasivo da publicidade. Trata-se de um público hipervulnerável que precisa, portanto, ser protegido em lugar de ter sua ingenuidade explorada com fins lucrativos. Portanto, a criação de políticas públicas regulando a comunicação mercadológica dirigida ao público infantil, a conscientização da sociedade e a educação das criançassão fundamentais para garantir às crianças e adolescentes condições para um desenvolvimento saudável.
Itucombr - Quais as mídias consideradas mais agressivas para o consumidor, no sentido de fazê-lo querer consumir cada vez mais?
Maria Helena - Embora uma das características do marketing seja explorar todos os espaços possíveis onde captar a atenção do consumidor, a TV, à frente dos sites e dos celulares e outras mídias, ainda é o canal mais usado para atrair a atenção e oferecer produtos e serviços às crianças e adolescentes. Hoje a criança brasileira é a que mais assiste TV no mundo: 4:54 minutos diários segundo o Ibope. Soma-se a isso o fato de que cada comercial é inserido não apenas uma vez, mas várias em um único dia e em vários canais onde a criança possa estar sintonizada. Para se ter uma idéia do grau de exposição das crianças às mensagens comerciais, em outubro de 2010, a equipe do Projeto Criança e Consumo monitorou 5 canais infantis da TV fechada (Discovery Kids, Cartoon Network, Disney XD, Nickelodeon, Boomerang) e 2 canais abertos (SBT e Globo) para identificar a quantidade de publicidade dirigida a crianças. Foram monitoradas 10 horas de programação (das 8h às 18h) e identificadas cerca de 350 publicidades diferentes, com um total de aproximadamente 1.100 inserções comerciais.
Itucombr - Como o Criança e Consumo vê a interferência da Internet na vida do consumidor?
Maria Helena - Cada vez mais forte, porém, não tão contundente quanto a TV, uma vez que o ato de acessar um site depende de alguma escolha prévia, enquanto ligar a TV é um ato quase mecânico em função do hábito bem mais enraizado entre as pessoas e pela própria disponibilidade e fácil acesso ao aparelho dentro dos lares. Mesmo assim, os anunciantes têm investido na comunicação via internet por ser um canal cada vez mais usado também pelas crianças. Uma pesquisa da Nilsen, de 2010, mostra que 14% dos internautas brasileiros são crianças entre 2 e 11 anos de idade.
Em função da curiosidade natural das crianças e da própria facilidade que elas demonstram ter em relação a novas tecnologias, isso se torna um risco para a formação delas. Mesmo que o site tenha limitações para determinada idade, sempre há a possibilidade de elas acessarem um link aparentemente despretensioso na lateral da página que a conduzirá a um outro site com conteúdo menos adequado e assim sucessivamente. Isso tudo tanto pode o induzir a criança e o adolescente ao hábito de consumir em excesso quanto afetar sua formação de valores, bem como por em risco sua segurança.
Além disso, na rede a comunicação mercadológica confunde-se mais facilmente com o conteúdo de entretenimento. A criança está em um site jogando e, no meio da brincadeira, o avatar compra uma sandália da marca X ou come um sanduíche da cadeia Y. São formas de divulgar marcas sem utilizar os meios mais tradicionais de publicidade. E quando tratamos do público infantil, isso é muito complicado e inclusive ilegal se formos observar a legislação brasileira. O Código do Consumidor determina que toda publicidade deve ser rapidamente identificada como tal, o que muitas vezes não acontece na internet.
Itucombr - Que situação seria positiva e saudável para as crianças como consumidores, em relação às propagandas?
Maria Helena - Levando-se também em conta a questão da sustentabilidade, &ea