A Ficção da Constituição
Completamos 30 anos sob a égide da atual Constituição Federal. Se por um lado podemos celebrar essa sua duração de três décadas, não podemos também ocultar o fato de que ela é na verdade e na prática uma obra de ficção, talvez das mais elaboradas que o planeta já viu.
Aqui não se está negando a importância que a Carta Magna tem para o funcionamento da nação. Nada disso. Nossa Constituição deve ser seguida e aplicada, respeitosamente. Mas acontece que ela carrega em si várias contradições que devem ser denunciadas, analisadas e resolvidas.
Muitos ficam orgulhosos ao citar que a de 1988 foi chamada de “Constituição Cidadã”, afinal foi elaborada por uma Assembléia Constituinte livre, logo após o fim do regime militar. Mas na verdade um primeiro defeito da nossa Constituição é prometer muita coisa para a população.
Em suas linhas vemos que cada brasileiro tem inúmeros direitos: casa, trabalho, saúde, alimentação, segurança, saneamento básico, transporte, etc. Mas na realidade sabemos que milhões de brasileiros não têm acesso a nada disso. Como diz a sabedoria popular, “o papel aceita tudo”. E essa é apenas uma das falhas da nossa Constituição.
Nossa Carta Magna tem leis para tudo, mas não faz cumprir grande parte delas. Promete tudo ao povo, mas não entrega nem metade do prometido. Determina ações jurídicas sobre uma porção de situações que, passados 30 anos, pasmem!, ainda não foram devidamente regulamentadas.
Se cada país tem a Constituição que merece, a brasileira tem mesmo a cara daqueles que a fizeram. De certa forma, ela reflete o mau comportamento dos políticos de sempre, com muita promessa e pouca realização, muita expectativa e pouca realidade.
O povo também tem uma visão bastante superficial a respeito da Constituição. Muitos brasileiros sequer passaram brevemente a vista sobre qualquer página da nossa Carta Magna, desconhecendo seus direitos e, principalmente, seus deveres. Chega a ser cômico, no Brasil, ver pessoas defendendo a Constituição sem sequer conhecerem algo do seu conteúdo.
A grandeza da nossa Constituição não deveria ser medida pela quantidade de leis, pelo número de páginas ou pelo passar de décadas. Nossa Constituição seria realmente grande se funcionasse de verdade, ajudando as instituições a desenvolverem a democracia.
A Constituição mais antiga e mais curta em vigor é a dos EUA, elaborada em 1789. Tem apenas 7 artigos e 27 emendas, que cabem em 5 páginas. A democracia norte-americana é muito mais funcional e realista do que a nossa, precisamos dar o braço a torcer nesse quesito.
Portanto, ninguém se desespere no caso de, em alguns anos, haver a necessidade de rever a nossa Constituição. Será algo bem-vindo. O Brasil não é mais o mesmo de 1988 e precisamos corrigir algumas contradições que, por causa do populismo e da falta de prática democrática, acabaram refletindo negativamente na nossa Carta Magna.