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Publicado: Terça-feira, 1 de novembro de 2005

A Formação do Profissional do Século XXI

Nas últimas décadas do século vinte e início do século vinte um, todos os prêmios Nobel de Física foram atribuídos a pesquisadores de grandes centros de investigação. Cientistas desse período - meados até final dos anos 90 - apresentam características que os diferenciam de seus antecessores, os pesquisadores do início do século passado. Os físicos de hoje são profissionais que conseguiram reunir excelência intelectual à capacidade de coordenar, estimular talentos, lidar com vaidades e frustrações, além de negociar contratos milionários de financiamento para suas pesquisas científicas. Nos dias atuais, pesquisadores trabalhando isoladamente, como acontecia anteriormente com seus colegas, é um quadro impensável.
Num outro cenário igualmente montado no dinâmico palco do início desse milênio, o profissional bem sucedido - como por exemplo o executivo de uma grande empresa - também exibe um perfil bem diferente daquele que era esperado há alguns anos. As grandes empresas mudaram a maneira de enxergar e contratar seus profissionais. Um estudo conduzido pelos Laboratórios Bell, em Nova Jersey, nos Estados Unidos ilustra bem o porquê dessa mudança. Nessa empresa trabalham engenheiros eletrônicos encarregados de desenvolverem novos produtos, formando equipes de mais de 150 pessoas. A eles, nos estudos citados, foi pedido que apontassem os colegas mais produtivos e mais eficientes. Surgiu algo em torno de uma dezena de nomes. As credenciais acadêmicas, o QI e o tempo de serviço não foram os fatores determinantes na escolha. Os ganhadores, depois se descobriu, eram aqueles que melhor sabiam conviver com os demais, que estavam sempre motivados, otimistas e que pareciam confiáveis. Se percebeu também que quando essas pessoas precisavam de uma solução técnica para um problema, mandavam uma mensagem pelo computador e conseguiam as respostas imediatamente. Os demais esperavam até duas semanas para terem suas dúvidas solucionadas. A capacidade de criar relações de companheirismo foi o que falou mais alto.
Exemplos em grupos brasileiros também explicitam essa mudança no perfil do profissional procurado pelas grandes empresas. A psicóloga Ana Maria Cadavez, da consultoria KPMG, de recursos humanos, especializada na contratação de dirigentes de empresa do porte da Aço Villares, General Motors, Ciba-Geigy, IBM ou Citibank, conta que, na seleção de profissionais, o fato do candidato ser uma pessoa que consegue manter amigos durante décadas acaba sendo um dos fatores importante na contratação. Entende ela que pessoas com essa característica se mostram capazes de qualidades como afabilidade, compreensão e gentileza no trato. Esse exemplo, assim como os dois outros citados acima, mostram que, na atualidade, não basta aos profissionais terem um excelente currículo e um alto QI; outras características também importantes são exigidas.
Evidentemente essas mudanças de paradigma não ocorreram por acaso. Há referenciais teóricos que as justificam. Uma dessas teorias - Teoria das Inteligências Múltiplas - foi proposta pelo psicólogo da Universidade de Harvard, nos EUA, e propõe que os seres humanos têm sete inteligências: a intrapessoal (saber quais são seus limites, quais suas aspirações e medos, e qual a capacidade de usar esse conhecimento para ser eficiente no mundo), lógico-matemática (habilidade para o raciocínio dedutivo, como a de um cientista), lingüística (a habilidade para lidar criativamente com as palavras, como um poeta por exemplo), espacial (habilidade de relacionar padrões, perceber similaridades nas formas e conceituar relações, como no caso de um escultor), musical (capacidade de pensar em termos musicais, como um compositor), corporal-cinestésica (refere-se à habilidade de usar o corpo todo ou partes para resolver problemas; atletas como Pelé constituem um bom exemplo) e interpessoal (inclui a habilidade de compreender outras pessoas, como trabalhar eficientemente com elas). Para Gardner, o ser humano se desenvolve e adquire conhecimentos e habilidades pelo estímulo adequado a uma ou mais dessas inteligências.
A outra trilha, pela qual se caminha próximo de Gardner, é a proposta pelo psicólogo americano Daniel Goleman, autor do sucesso editorial chamado Inteligência Emocional. Goleman elaborou uma pesquisa intensa, trabalhando em escolas, em empresas e com famílias e mostrou que o sucesso na vida profissional repousa numa combinação adequada de pensamento racional agudo com controle e auto conhecimento emocional. Com base nessa teoria de Goleman é que surgiu então o QE (quociente emocional), em contraposição ao QI (quociente de inteligência). Em julho passado, em entrevista à Folha de São Paulo, pouco antes de sua visita ao Brasil, Gardner considerou que seu trabalho é compatível com o de Goleman, apesar de algumas divergências nos dois pontos vista. A compatibilidade se observa facilmente em alguns aspectos de suas teorias. O que o primeiro chama de inteligência interpessoal o segundo denomina inteligência emocional.
A classificação de Gardner foi montada no final do século vinte e vem tendo repercussões na forma de educar as crianças, no desenvolvimento de currículos escolares e também na montagem de equipes de trabalho. Refletindo sobre as teorias de Gardner e de Goleman, entendemos que profissionais que trabalham com educação devem olhar o trabalho da escola de modo diverso do que tem sido feito até agora. Isso porque as escolas, na medida em que exercem grandes influências na formação dos indivíduos, têm - de um modo geral - desenvolvido seus trabalhos numa óptica muito diferente das propostas pelos dois psicólogos. Àqueles indivíduos que não têm boas avaliações nos testes escolares é dada a classificação de fracos, lentos, pouco inteligentes e pouca luta houve por parte da escola contra as causas desses fracassos. No fundo, por trás dessa maneira de ver a educação, está a idéia de que os melhores alunos, aqueles com QI mais alto, estariam predestinados a ter sucesso na vida, ter as melhores carreiras profissionais, ir para as melhores universidades. A escola então trabalha para desenvolver aqueles indivíduos que são “realmente inteligentes”. Em parte essa visão se justifica porque muitas das ocupações profissionais das últimas décadas dependiam mais da inteligência lógico-matemática, como a engenharia, ou da lingüística, como é o caso do direito.
Da teoria de Gardner pode-se inferir que, se boa parte da escolaridade implica dominar disciplinas e entender conceitos, então essas disciplinas ou conceitos podem ser aprendidos melhor se são desenvolvidos através de tipos diferentes de inteligência; não somente a lógico-matemática ou a lingüistica como tem sido comum. Cabe a escola então estabelecer suas metas e treinar as inteligências todas que são relevantes para ela. Se pensarmos sob a &o

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