Publicado: Sexta-feira, 6 de julho de 2007
A pós-modernidade e seus ritmos
Antes de iniciar este texto, convido o leitor a um pequeno aquecimento: sente-se confortavelmente em sua cadeira, relaxe braços e ombros e investigue seu corpo e seus pensamentos em busca do seu ritmo interior.
Penso que cada um de nós tem um ritmo próprio, uma velocidade de funcionamento que é resultado de nossas funções orgânicas, nossos pensamentos e preocupações, nossas motivações, expectativas, crenças, o que fizemos na véspera, etc... Creio que este ritmo é dinâmico e se modifica ao longo de um mesmo dia e ao longo dos dias...
Pois bem, gostaria que o leitor investigasse qual o seu ritmo neste momento. Que entrasse em contato com este ritmo e percebesse como ele se manifesta em seu corpo, através da velocidade dos batimentos cardíacos e movimentos respiratórios, das mãos que podem estar quietas ou manipulando nervosamente uma caneta, das pernas, que podem estar quentinhas dentro de um pijama ou balançando desgovernadamente, como se tivessem vida própria.
Tomando este ritmo próprio como um padrão, pediria que o leitor comparasse esta sua velocidade própria àquela do mundo à sua volta: carros, aviões, telefones celulares, internet...Há um descompasso? Então ótimo, é aqui que eu gostaria de chegar com este exercício e a partir deste sentimento é que inicio minha reflexão.
O período em que vivemos atualmente, chamado de pós-modernidade, ou modernidade reflexiva, ou ainda supermodernidade, tem se estruturado com algumas características bem marcantes: o materialismo, que associa reconhecimento pessoal através do dinheiro que se tem; o hedonismo, ou seja, a busca de sensações novas e excitantes; a permissividade, que cria um clima de impunidade e individualismo; o relativismo, que em articulação com a permissividade predispõe à criação de éticas subjetivas e individuais e o consumismo, que associado ao materialismo nos fala de uma nova forma de liberdade - a de consumir.
Para que essa “Nova Ordem” social se estabeleça e se mantenha em vigor, são necessárias algumas adequações sociais. Ora, se algumas das tônicas da pós-modernidade são o materialismo e o consumismo, tornou-se necessário o desenvolvimento de um sistema de oferta de produtos novos, acessíveis, descartáveis, que possam atender a esta demanda de consumo e satisfação do prazer imediato.
Tudo tem que ser rápido: a criação da novidade, a disseminação da nova idéia ou do novo produto, tornando-o desejável, sua produção em larga escala, seu consumo, em substituição ao produto similar que havia no mercado, e finalmente seu descarte, dando lugar para um novo produto semelhante, que substitua o anterior com alguma vantagem. Esta vantagem pode ter um caráter tecnológico, ou meramente estético. Contudo, pelo seu status de “novo”, conquista junto ao consumidor o direito de ser adquirido.
A velocidade aumenta e já não existe mais lugar para o velho refrigerador que a avó ganhou de presente de sua madrinha de casamento há quarenta anos.
Tudo tem que ser novo e a novidade nos envolve, nos seduz e nos dá a sensação de pertencimento ao mundo atual. Por esta razão, já se pode no primeiro semestre de 2007 comprar um veículo modelo 2008!
Muitos outros exemplos deste tipo podem ser elencados, porém busco uma reflexão que vá além da questão mercadológica: que tipo de ritmo a pós-modernidade nos impõe?
Estamos nos habituando a esta velocidade: quando criança, meus pais compraram um aparelho de telefone em um dos famosos “planos de expansão”, oferecidos pela Companhia Telefônica de São Paulo. Foi um evento... ter um aparelho de telefone em casa era uma coisa rara, para poucos. Após três anos de pagamentos das mensalidades, finalmente a linha telefônica chegou ao bairro no qual residíamos e nosso aparelho de telefone foi ligado. Isto era normal para a época, e estou falando de uma grande cidade como São Paulo, há trinta anos. Hoje, podemos comprar um aparelho de telefone celular em uma loja e imediatamente falar com outro país ou acessar a internet e ler nossa correspondência eletrônica.
Estas mudanças nos trazem conforto? Certamente que sim, e pessoalmente acho as facilidades tecnológicas ótimas e de grande utilidade.
Os reflexos destas mudanças são sentidos em vários setores de nossas vidas: em nossos hábitos alimentares, havendo um grande impulso nos restaurantes do tipo “fast food” e “self service”; nos esportes, nos quais observamos grande interesse pelos ditos “esportes radicais”, que envolvem risco e velocidade; nas imagens que assistimos na televisão, como os vídeo-clips, por exemplo, nos quais observamos uma superposição de imagens e estímulos muito rápidos; nos jogos de computador; na “batida” musical da “techno music”; na maneira de nos relacionarmos afetivamente, e o evento que melhor representa esta mudança é o “ficar”. Tudo se torna rápido, novo, permissivo, descartável.
Meu questionamento repousa sobre as mudanças em nosso ritmo pessoal que são causadas pela pós-modernidade. Exemplifico: qual a tolerância média que temos hoje para uma fila? Quanto realmente conseguimos esperar para que alguém termine uma frase antes de interrompermos nosso interlocutor, terminando por ele a frase em curso? Quanto conseguimos esperar sem buzinar pelo início do movimento do carro parado à nossa frente, quando o semáforo abre?
Estas questões me fazem pensar que a pós-modernidade traz como efeitos colaterais pelo menos dois grandes males relacionados a ritmo: intolerância e ansiedade.
A intolerância está geralmente relacionada à espera. Em um tempo em que somos cobrados e estimulados a realizarmos todas as tarefas em uma velocidade muito grande, somos presas da intolerância frente a uma pessoa que esteja “funcionando” em uma velocidade inferior à nossa. Seguramente esta intolerância piora muito as rela&ccedi
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