A revolução dos bichos
Acabo de concluir a leitura de um dos melhores livros que li na minha vida. Trata-se de “A Revolução dos Bichos” (Animal Farm), de George Orwell (1904-1950). É obra das mais famosas na literatura inglesa moderna, lançada em 1945, mas que ainda serve como referência para estudos. Também pode ser considerada uma das mais bem feitas parábolas sobre os sistemas políticos e sociais inventados pelo ser humano.
O nome verdadeiro de Orwell era Eric Arthur Blair. Jornalista e romancista foi um entusiasta do comunismo. Mas decepcionou-se logo depois, principalmente com na fase stalinista do regime implantado na União Soviética. Os últimos anos de sua vida e de seu trabalho dedicou no combate a tais idéias, acirrando o debate ideológico e dividindo o mundo intelectual nos tempos da Guerra Fria.
A história é interessante e a linguagem muito acessível. Às vezes passa a impressão de se tratar até de um livro infanto-juvenil. Mas no desenvolvimento da leitura podemos perceber, nas entrelinhas, toda a riqueza de paralelos e comparações pensada pelo autor para nos fazer enxergar as intrincadas relações sociais.
Tudo começa tendo uma fazenda como cenário. É a propriedade do Mr. Jones, que tem em seus estábulos e pastos diversos tipos de animais. Vacas e cavalos, porcos e cachorros, patos, galinhas, carneiros: todos trabalham muito, descansam pouco e comem apenas o suficiente.
Certo dia, cansados e sentindo-se explorados pelos humanos, os animais decidem fazer uma revolução. Na primeira chance que se apresenta, expulsam Mr. Jones da fazenda e a tomam para si. Os bichos fazem a maior festa e prometem para si mesmos tempos muito melhores, de fartura e descanso. Orwell faz, dessa maneira, uma comparação com as promessas do regime comunista: um mundo no qual todos são iguais e a propriedade é repartida.
Passada a euforia do primeiro momento, é preciso reorganizar as coisas. Com inteligência superior, os porcos assumem a liderança. Os animais criam um hino, uma bandeira e cerimônias cívicas para honrar a revolução. Decidem criar também um conjunto de leis para regulamentar a vida de todos em sociedade.
Algumas das leis estabelecidas eram: “Nenhum animal dormirá em camas”; “Nenhum animal beberá álcool”; “Nenhum animal matará outro animal”; “Todos os animais são iguais”. Além disso, todos concordaram em cortar todas as relações com os seres humanos e seus hábitos perniciosos.
Com o passar do tempo, a teoria foi dando lugar à realidade. Aproveitando-se de sua inteligência maior em relação a outros bichos, os porcos assumem o controle da fazenda. Refazem os princípios da revolução a seu favor, passam a morar na casa que era de Mr. Jones e até mesmo a utilizar camas, roupas e talheres.
Quando decidem criar uma escola na fazenda, decidem que esta será frequentada apenas pelos porquinhos. Resolvem também que somente os porcos terão direito a rações de fruta e leite diariamente, pois cuidar da administração e segurança da fazenda resultava em um gasto enorme de energias.
Para garantir o cumprimento de todas as ordens, os porcos aliam-se aos cachorros. Estes se tornam os verdadeiros cães-de-guarda da revolução, violentos e temidos. São os cães que se encarregam de eliminar os opositores e também de cumprir as sentenças de morte dirigidas aos traidores do movimento.
Com o passar dos anos, a heróica revolução dos bichos foi esquecida. Até seus mandamentos foram alterados para uma versão mais permissiva: “Nenhum animal dormirá em cama, com lençóis”; “Nenhum animal beberá álcool, em excesso”; “Nenhum animal matará outro animal, sem motivo”; “Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais que outros”.
Outra mudança foi a relação com os seres humanos, que passou a ser aceita como política de boa vizinhança. Com esse pretexto, os porcos também trataram de fazer acordos comerciais e políticos, além de realizar festas, noites de carteado e beberragem. Por fim, os princípios da revolução foram totalmente abandonados. E os animais da fazenda passaram a ter menos liberdade, comida e descanso do que nos tempos de Mr. Jones...
É notável o talento de Orwell para conduzir a trama, com todas as suas nuances. Leitura imperdível, prazerosa para os amantes da literatura e imprescindível para estudantes de todas as idades. Como tudo o que é bom, a melhor parte é justamente o final. Um desfecho que surpreende pela esperteza de seu simbolismo e pela eficácia de sua mensagem.
Amém.