Colunistas

Publicado: Quarta-feira, 11 de maio de 2005

Afogamento no oceano tecnológico

Afogada em um oceano tecnológico, sem ninguém a quem recorrer. Foi assim que me senti ao ser atendida pelo tele-atendimento de um famoso cartão de crédito.
Chega a ser inacreditável, mas retrata uma triste realidade que vem ocorrendo no mundo: o fenômeno do oceano tecnológico que separa as pessoas do verdadeiro significado do atendimento. Atender é relacionar-se, servir, preocupar-se com o outro, querer deixá-lo satisfeito. Não é isso que tenho visto por aí.
Embora eu seja uma adepta tecnológica, percebo que está havendo um desvio de percurso, na medida em que a tecnologia está substituindo o homem em vez de servi-lo. Na saúde, é comum ver profissionais especialistas na leitura de máquinas cada vez mais modernas e sofisticadas, que se esquecem de olhar seus pacientes (o que dirá ouvi-los?).
Nos negócios, a história não é diferente. As empresas de telefonia, por exemplo, têm gastado milhões em sofisticados softwares, treinamentos, consultorias, mas o resultado final é desanimador. O pobre atendente sente-se uma máquina e, óbvio, repassa este comportamento ao cliente que fica desnorteado, sem ter realmente com quem falar.
Reflito: Há cinco anos trabalho com o mundo virtual. É comum ouvir por aí que o computador afasta as pessoas. Minha experiência tem sido exatamente oposta. O problema nunca é da tecnologia. É sempre do uso que fazemos dela. Certas atividades podem — e devem- ser automatizadas. Outras não, jamais. Muitas empresas estão automatizando o relacionamento humano e esse é o grande problema. Exemplo: quando recebemos uma mensagem automática por e-mail não nos sentimos ouvidos, percebidos. Por outro lado, quando percebemos que uma pessoa leu o nosso e-mail e respondeu pra gente, sentimos que de alguma forma valemos alguma coisa, pois prestaram atenção no nosso problema.
Tenho milhares de exemplos coletados ao longo desses 5 anos pilotando o www.itu.com.br, que ilustram o quanto o uso bem empregado da tecnologia pode aproximar as pessoas.
Esse artigo é uma tentativa de acordar, nem que seja apenas uma pessoa. Relacionar-se e importar-se com o próximo é a principal energia do viver. Esquecemos disso. Tanta tecnologia em jogo, tanto dinheiro investido e a que ponto chegamos! A ponto das pessoas acharem que é normal tratar os outros com descaso, com indiferença. A ponto de que a única coisa que importa é livrar-se do problema e salvar a própria pele. A ponto de que ser humano passa a ser secundário, pois nossos modelos e referências são cada vez mais as máquinas. Não, a vida é muito mais do que isso. Como dizia Charles Chaplin, “A vida nos é dada para grandes coisas”. Que possamos mergulhar no oceano tecnológico, mas vivê-lo não como um divisor de águas entre as pessoas e sim como uma poderosa ferramenta de evolução da alma humana.

Comentários