Amar Cristo é fácil. Os nossos irmãos, nem tanto!
O mandamento é claro: amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo, como a nós mesmos. Quanto ao próximo, Cristo dimensiona: amai-vos uns aos outros como eu vos amei.
Nada mais! Tudo se resume no maior mandamento da Lei divina: o Mandamento do Amor. Ele é absoluto, universal e incondicional.
Quanto a amar a Deus, nada a opor; afinal devemos tudo a Ele e, ao menos por gratidão, isso acaba sendo observado. Além do mais Deus não nos incomoda, não compete conosco, não atrapalha nossa liberdade... Porém, não fica tão pacífica a prescrição de amá-lo sobre todas as coisas, pois gostamos de nos amar excessivamente, como também, os bens materiais, a fama, o poder, o dinheiro.
Ainda mais difícil é cumprir a segunda parte, amar o próximo, nossos semelhantes, com todos seus defeitos, suas impertinências, teimosias, manias, disputas. Diferentemente de Cristo, estes nos “incomodam”, disputam conosco a vida do mundo, geram comparações, rivalidades...
Jesus Cristo veio nos mostrar a força do Amor, único capaz de consertar o homem e o mundo. Consumiu sua vida na dedicação aos seus. O episódio da Paixão põe à mostra um festival de traições, e que continuam até hoje...
Traímos seu amor quando não damos de comer a quem tem fome, quando não vestimos aquele que está nu, não matamos a sede de tantos sedentos e ressequidos, quando não atendemos os doentes, não cuidamos dos desamparados...
Continuamos a trair o amor de Cristo quando nos deixamos levar pelo orgulho, pelo egoísmo.
Traímos o amor de Cristo quando abandonamos a Fé e perdemos a Esperança; quando esquecemos Deus; quando fazemos somente a nossa vontade....
Traímos o amor de Cristo quando abandonamos a Verdade e abraçamos as mentiras do mundo...
Amamos a Deus, mas ignoramos sua Vontade!
Nunca podemos esquecer que o mandamento do Amor se fundamenta na Cruz e abrange duas dimensões: a vertical que nos leva a “olhar para o alto” e a horizontal, que nos leva a “olhar para a terra”, para a realidade dos nossos irmãos.
Desse modo, como bem lembrou o arcebispo Paul Josef Cordes, ao apresentar a mensagem do papa Bento XVI para a Quaresma de 2007, elevar o olhar a Cristo não significa “substituir o serviço ao homem pelo serviço a Deus”.
Ao olharmos para o Cristo trespassado, o nosso coração, por vezes endurecido, deve-se abrir ao outro; seus braços abertos apontam e ao mesmo tempo “querem abraçar” todos aqueles que sofrem.
Deus ama a todos e pede isso de nós. Insiste sobre o dever do amor; um amor testemunhado concretamente nas relações entre as pessoas: respeito, colaboração, ajuda generosa. Lembremos ainda que o próximo é aquele necessitado da nossa atenção e solidariedade. Mas precisamos “ver” o nosso próximo como Jesus, como o Bom Samaritano, isto é, com o coração que vê onde se necessita de amor e, sem “passar de lado”, age com caridade.
No livro “O Meu Cristo Partido”, o autor (Ramón Cué) coloca as seguintes palavras na boca de uma imagem do Cristo mutilado: “(...) Há muitos cristãos que tranquilizam a sua consciência beijando um Cristo belo, obra de arte e de museu, enquanto ofendem, mutilam ou roubam o pequeno Cristo de carne, que é o seu irmão...”
Jesus nos pede para amar até os nossos inimigos. Os pedidos que o Senhor nos faz através do Evangelho são possíveis de ser observados na medida da grandeza de nossa alma, da nobreza de nossos sentimentos: amar também àqueles que não nos amam, fazer o bem àqueles que nos fazem o mal, dar sem esperar a devolução e até rezar pelos nossos inimigos.
“Então, sim, ao amares teu inimigo, estás a amar um irmão. É esse o motivo por que o amor ao inimigo é a perfeição da caridade, já que a caridade perfeita consiste no amor aos irmãos. Ama e fazes o que quiseres; se te calas, cala-te por amor; se falas em tom alto, fala por amor; se corrigires alguém, faze por amor. Pois é preciso amar o homem e não o seu erro. O homem é obra de Deus, o erro é obra do homem. Ama a obra de Deus e purifica as obras do homem. Se existe o inimigo é porque existe o erro. Retira o erro e em vez de enxergares um inimigo, contemplarás um irmão.” (Santo Agostinho)