Bem-Vindo à Casa de Bonecas
Como um filme pode ser tão forte e verdadeiro como esse que o diretor “Todd Solondz” produz e escreve o roteiro? É um filme tão real, mas tão real que realmente você se pergunta como sobrevive na escola? Por que, provavelmente, aqueles que irão ler este texto serão pessoas que já sofreram algum tipo de bullying.
Acho engraçado as formas de agressão que o filme coloca e como a protagonista lida com isso, ou melhor, não lida.
Filmes com essa temática de violência na escola sempre tratam de um assunto importante e, vamos dizer nostálgicos e perturbadores. O documentário que saiu em 2011, “Bully”, trata desse assunto muito mais a fundo e faz um excelente retrato psicológico das vítimas. Existem filmes como “Elefante”, de 2003, do diretor Gus Van Sant que fala sobre a tragédia na escola de Columbine de uma forma mais romanceada e violenta dos jovens americanos, e principalmente de aceitação em uma América mais frágil que é a do começo dos anos 2000. E é claro, o famoso e polêmico documentarista Michael Moore, que fez também um excelente trabalho com “Tiros em Columbine” onde ele retrata as facilidades de se conseguir uma arma nos Estados Unidos, que também é focado no “Elefante”. Você percebe que o “American Dream” é conseguir uma metralhadora pelos correios.
Mas voltando ao filme, é engraçado a situação de Heather Matarazzo que faz a jovem “Dawn Wiener”. Ela é o oposto de tudo que é bom na escola, ela é xingada constantemente, humilhada e não é aceita nem pelos pais ou por seus professores. Acho que o Seth Macfarlane, criador de “Family Guy”, usou um pouco dessa personagem para se inspirar na “Meg Griffin” que também sofre os mesmo problemas que a protagonista.
Dawn está na sétima série e vive entre a escola e sua casa, seu único amigo é um jovem chamado Ralphy (Dimitri DeFresco) que frequentemente é insultado também. Sua família é totalmente reclusa a filha e não vê os problemas que ela está enfrentando, só tem olhos para a sua irmã mais nova que é bonita e mais nova do que Dawn, mas pelo que eu percebi de sua família, parece que eles esqueceram da filha do meio. Seu irmão Mark (Matthew Faber) é um cara inteligente e bem independente, e isso abre vaga para a sua irmã mais nova. O pai de Dawn parece um ser invisível, tanto na história como na vida de qualquer família que tenha um comportamento assim. A mãe é super controladora e um pouco louca em alguns requisitos, principalmente com Dawn que é bem sonhadora e parece não conseguir enxergar as consequência de suas atitudes ou o que alguns amigos falam para ela.
O seu bullying é Brandon McCarthy (Brendan Sexton III), um garoto largado, irresponsável e que não tem consciência alguma de suas atitudes como ele mesmo afirma para Dawn em uma cena: “Amanhã se prepare para ser estuprada”. E o mais incrível é que Dawn não conta para ninguém o que acontece com ela, e quando chega “o dia do estupro”, simplesmente ela vai com Brandon para um terreno baldio, quando pensamos que vai acontecer alguma atrocidade o jogo se vira e vemos um outro lado de Brandon um garoto sensível, um pouco rude, mas mesmo assim totalmente abandonado e sem perspectiva, apesar de ser um personagem tenso e profundo ele ainda não perde seu jeito rude.
As coisas se complicam ainda mais para Dawn quando ela se apaixona por um garoto mais velho, Steve (Eric Mabius), um garoto que apesar de ser bonito não tem nada na cabeça e nem tem um ponto de profundidade diferente dos outros personagens. O engraçado no filme é que os únicos que chegam a ter alguma personalidade marcante são os mais “Freaks”, como o rebelde e a garota feia. Essa exaltação da contracultura é muito bela e bem explorada no filme, gosto dos pontos em que o filme não romanceia e nem tenta ser exagerado, ele simplesmente acontece, não interessa o que vai acontecer com os outros personagens, o foco é a Dawn então acontecem várias coisas interessantes com os coadjuvantes, mas com ela não. Talvez Todd Solondz quisesse focar nisso para mostrar como é a vida entediante de Dawn.
“Bem-Vindo à Casa de Bonecas” é isso, um filme cru e sincero, talvez não para todos, por que vão achar o filme talvez um pouco parado e sem um final sensacional em que a personagem sai daquela situação e dê uma lição de vida para todos. Vemos uma garota que simplesmente aceita aquilo, ela não reage, e esse realismo absoluto é que faz esse ser um dos melhores filmes da contramão de Hollywood, junto com “Sombras” do diretor John Cassavetes; “Faça a coisa certa” com o polêmico Spike Lee e; “Magnólia” do sensacional Paul Thomas Anderson.
Vale a pena conferir, mas se afaste do filme se você acha que vai encontrar algum pingo de felicidade em algo que retrata o bullying como uma alternativa para as pessoas fugirem de frustrações e da triste realidade em que vivemos.