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Publicado: Sábado, 7 de março de 2015

Blecaute

Blecaute
"Spirit of Transportation", de Karl Bitter

Naquela manhã o Sol despertou com o brilho que fora esquecido no tempo. Surgia no ar a sensação de alívio e segurança própria do náufrago que encontra tronco de árvore em águas turbulentas. As mães se prostraram sobre seus tanques, as filhas correram esticar varais e as crianças sujas sorriam brincando na lama escura. O cinza, comum na maior parte do tempo, usurpara-lhes a experiência do verde, das flores e do calor. As rádios previam aqueles primeiros raios solares em seus boletins meteorológicos, porém sem crédito ante os frequentes desacertos. A própria "moça do tempo" há muito não escondia sua incredulidade frente às câmeras, parecendo apenas cumprir sua jornada de trabalho. Os pais, já em alto mar, cancelaram a pescaria a fim de voltarem para celebrar a luz com a família. Dançaram, abateram animais e consumiram seu trigo. Vestiram roupas limpas para o jantar, depois foram dormir embriagados. Amanheceram fartos, mais gordos e preparados para os próximos imprevisíveis anos de treva.

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