Publicado: Quarta-feira, 5 de abril de 2006
Bolo de cenoura
Eu havia acabado de assistir pela Cultura a um programa sobre futebol: Momentos Inesquecíveis do Futebol, se não estou enganado. Apesar de não me considerar um típico cidadão brasileiro no que diz respeito às questões futebolísticas, não havia como não assistir ao programa esportivo daquela manhã de sábado. A reportagem nos transportou de volta ao famoso Estádio Asteca, palco do antológico embate final entre Brasil e Itália, com o memorável 4 a 1 que o grupo canarinho impôs aos "spaguetti" de além mar, dos quais descendemos com muito orgulho.
Particularmente, a reportagem acabou trazendo-me de volta um sabor muito especial, uma vez que, dois anos antes daquela data, eu havia estado de passeio por terras mexicanas, paisagem agora dos Jogos Olímpicos de 68 e cenário de inesquecíveis momentos que ficaram perpetuados para a história. Ainda me recordo da partida final de vôlei entre União Soviética e Checoslováquia, logo após a invasão de Praga pelos tanques soviéticos; lembro-me ainda dos atletas americanos Tommie Smith e John Carlos, respectivamente ouro e bronze nos 200 m, que levantaram os punhos cerrados e com luvas negras, saudação característica do grupo Panteras Negras, em protesto contra os conflitos raciais nos EUA; além desses dois episódios, também me recordo do primeiro salto em altura no estilo hoje consagrado e do qual se utilizam os atletas dessa modalidade, salto esse levado a cabo pelo seu criador, o norte-americano Richard Fosbury. Se estou certo, Fosbury levou o ouro com a marca de 2,24 m. Por último, ressalte-se que o nosso atleta Nelson Prudêncio também se consagrou ao conseguir a medalha de prata com 17,27 m no salto triplo.
Bem, encerrado o programa futebolístico, entre assistir aos outros da programação televisiva e quase todos no estilo Raul Gil, preferi desligar o aparelho e me ocupar com algo qualquer que fosse mais interessante. Voltei por uns momentos à leitura do "Boca de Luar", livro do mestre Drummond, li mais umas três ou quatro crônicas geniais e fui então à cozinha para dar uma solução à fome que já me incomodava. Como meus dotes culinários sãos simplesmente risíveis, contentei-me com um sanduíche de presunto e queijo, um copo de refrigerante e um naco de bolo de cenoura com cobertura de chocolate, delicioso produto de uma panificadora do bairro.
Após o lanche, retornei ao escritório, resolvido a desfrutar o primeiro sábado, depois de vários outros, todos em seqüência, de árduos trabalhos profissionais ou de estudos igualmente cansativos. Destaquei dois CDs para ouvir, enquanto terminaria de ler as notícias mais frescas no jornal do dia. "Mensagem", com poemas de Fernando Pessoa musicados e cantados por Caetano, Elba, Gil, Ney Matogrosso e outros foi um dos escolhidos; o segundo era "Amar de Nuevo", do grupo chileno Inti-Illmani, parceiros que na época da ditadura ficaram famosos pelos seus cantos de apologia à liberdade dos povos latino-americano e de protesto contra o sangrento regime de Pinochet.
Num certo momento, parei a leitura para ouvir detalhes do canto "La Fiesta Eres Tú", cantado pelo octeto chileno e de autoria de Horácio Salinas, um de seus membros, em parceria com Patrício Manns. Fiquei assim, absorto por alguns minutos, deliciando-me com os sons emitidos pelos instrumentos e tocados em homenagem à "la música criolla latinoamericana", de rica poesia e harmonia típica, que atravessa centralmente a identidade cultural de nosso continente. Dessa maneira, fui navegando pelos acordes e acompanhando o canto: "Muchacha morena y triste / Se te perdió la alegria / Acércate a mi guitarra / Para cantarte la mía". Entre uns e outros pensamentos entrecortados que me vieram à mente, voltei mais duas ou três vezes à canção engendrada à morena. E foi no balanço das maracas e dos charangos que a fome tornou a voltar, agora duplamente; dessa vez havia também fome de gente. A música continuou tocando e as fomes foram aumentando. Assim, na falta da morena e também por não tocar guitarra, voltei à cozinha. Como um animal faminto, devorei integralmente o bolo de cenoura e, melancolicamente, saciei a fome do estômago.
Particularmente, a reportagem acabou trazendo-me de volta um sabor muito especial, uma vez que, dois anos antes daquela data, eu havia estado de passeio por terras mexicanas, paisagem agora dos Jogos Olímpicos de 68 e cenário de inesquecíveis momentos que ficaram perpetuados para a história. Ainda me recordo da partida final de vôlei entre União Soviética e Checoslováquia, logo após a invasão de Praga pelos tanques soviéticos; lembro-me ainda dos atletas americanos Tommie Smith e John Carlos, respectivamente ouro e bronze nos 200 m, que levantaram os punhos cerrados e com luvas negras, saudação característica do grupo Panteras Negras, em protesto contra os conflitos raciais nos EUA; além desses dois episódios, também me recordo do primeiro salto em altura no estilo hoje consagrado e do qual se utilizam os atletas dessa modalidade, salto esse levado a cabo pelo seu criador, o norte-americano Richard Fosbury. Se estou certo, Fosbury levou o ouro com a marca de 2,24 m. Por último, ressalte-se que o nosso atleta Nelson Prudêncio também se consagrou ao conseguir a medalha de prata com 17,27 m no salto triplo.
Bem, encerrado o programa futebolístico, entre assistir aos outros da programação televisiva e quase todos no estilo Raul Gil, preferi desligar o aparelho e me ocupar com algo qualquer que fosse mais interessante. Voltei por uns momentos à leitura do "Boca de Luar", livro do mestre Drummond, li mais umas três ou quatro crônicas geniais e fui então à cozinha para dar uma solução à fome que já me incomodava. Como meus dotes culinários sãos simplesmente risíveis, contentei-me com um sanduíche de presunto e queijo, um copo de refrigerante e um naco de bolo de cenoura com cobertura de chocolate, delicioso produto de uma panificadora do bairro.
Após o lanche, retornei ao escritório, resolvido a desfrutar o primeiro sábado, depois de vários outros, todos em seqüência, de árduos trabalhos profissionais ou de estudos igualmente cansativos. Destaquei dois CDs para ouvir, enquanto terminaria de ler as notícias mais frescas no jornal do dia. "Mensagem", com poemas de Fernando Pessoa musicados e cantados por Caetano, Elba, Gil, Ney Matogrosso e outros foi um dos escolhidos; o segundo era "Amar de Nuevo", do grupo chileno Inti-Illmani, parceiros que na época da ditadura ficaram famosos pelos seus cantos de apologia à liberdade dos povos latino-americano e de protesto contra o sangrento regime de Pinochet.
Num certo momento, parei a leitura para ouvir detalhes do canto "La Fiesta Eres Tú", cantado pelo octeto chileno e de autoria de Horácio Salinas, um de seus membros, em parceria com Patrício Manns. Fiquei assim, absorto por alguns minutos, deliciando-me com os sons emitidos pelos instrumentos e tocados em homenagem à "la música criolla latinoamericana", de rica poesia e harmonia típica, que atravessa centralmente a identidade cultural de nosso continente. Dessa maneira, fui navegando pelos acordes e acompanhando o canto: "Muchacha morena y triste / Se te perdió la alegria / Acércate a mi guitarra / Para cantarte la mía". Entre uns e outros pensamentos entrecortados que me vieram à mente, voltei mais duas ou três vezes à canção engendrada à morena. E foi no balanço das maracas e dos charangos que a fome tornou a voltar, agora duplamente; dessa vez havia também fome de gente. A música continuou tocando e as fomes foram aumentando. Assim, na falta da morena e também por não tocar guitarra, voltei à cozinha. Como um animal faminto, devorei integralmente o bolo de cenoura e, melancolicamente, saciei a fome do estômago.
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