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Publicado: Sexta-feira, 19 de março de 2010

Cadê nosso tempo?

Coisas da vida moderna impõem ao homem um ritmo de vida que chega a ser alucinante. Obrigado a se desdobrar em mil, ainda assim não dá conta de tudo e acaba estressado: Não tenho tempo... Estou atrasado... Agora não dá... Estou numa correria... O tempo passa rápido demais, não o vejo passar...

Embora tempo seja uma questão de preferência ou prioridade, essa máxima popular está fora de uso; são muitas as prioridades... O homem de hoje aumentou tanto sua agenda que o dia ficou curto; escravo das poucas horas disponíveis, corre atrás do tempo que insiste em escapar-lhe do controle. É um escravo do relógio. Com incontáveis obrigações assumidas, não tem tempo nem para si nem para os seus. Não tem tempo para as coisas boas da vida, para o lazer necessário, para atender o cônjuge e os filhos, para visitar os amigos, para os momentos de descanso mental, reflexões e orações, para jogar conversa fora. Não tem tempo para “perder tempo” e ganhar qualidade de vida.

Mas afinal, se o tempo é sempre o mesmo, cadê esse danado? O que será que aconteceu? Má administração. O homem realmente administra muito mal seu tempo, sua vida. 

Rouba tempo de sono para aumentar seu tempo. Adeus domingo, dia de descanso, dia do Senhor; aos poucos incorporado aos dias de semana e cada vez mais consumido pelas atividades comerciais.

Quanto à noite, reservada ao sono benfazejo, está ameaçada: agora quase tudo vai funcionando 24 horas, não apenas as atividades essenciais, mas supermercados, postos, conveniências, clubes, boates... Veja-se a vida noturna de São Paulo: a cidade não dorme, não para, não fecha para descanso. A cada dia mais atividades invadem esse espaço.

Despreza-se hoje em dia o tempo destinado a nossas refeições, muitas vezes reduzidas a alguns bocados apressados e mal engolidos. Daí, os maus hábitos e problemas de saúde, distúrbios de peso e de metabolismos, diabetes e outras consequências...

Corremos em ritmo alucinante e vivemos atrasados. Não dá tempo para viver, para ter paciência, tolerância, respeito; a calma dos outros nos perturba, nos deixa nervosos; os sinaleiros são nossos adversários, como também aqueles que os respeitam. As filas irritam, o volume de carros, os motoristas “lerdos”... Parece que tudo nos quer atrapalhar, nos fazer perder tempo.

Será que vale a pena tanta correria? Temos pouco tempo aqui na terra e nossa pressa não vai contribuir para aumentá-lo, antes poderá diminuí-lo. Se não conseguimos colocar mais tempo em nossa vida, o ideal é colocar mais qualidade...     

Não temos tempo para ser e nos satisfazemos com o ter.

Será que estamos vivendo, ou sendo consumidos...?

Demandas, demandas, demandas. Hoje tudo é urgente. Gostaríamos que fosse para ontem. E o tempo passa, voa para os apressados, os desesperados...

A propósito, a jornalista e repórter Eliana Brum (revista Época) comenta sobre essa neurótica falta de tempo: “Tenho, algumas vezes, a sensação de que estamos todos, cada um a sua maneira, vivendo uma gincana, rigidamente cronometrada. Parece que nunca trabalhamos tanto. E nunca faltou tanto para fazer. Cada vez acordamos mais cedo e dormimos mais tarde. E estamos sempre atrasados e devendo tarefas para todo mundo. Não é maluco precisar de agenda para saber o que fazer? Ou no início da manhã de segunda-feira já estar atrasado para as necessidades do mundo?

Toda a parafernália eletrônica que supostamente deveria servir para nos libertar só aumentou nossas tarefas. Agora, é encarado como ofensa grave desligar o celular para não ser encontrado ou para almoçar sem ser perturbado. Vejo todo mundo almoçando com seus aparelhos na bandeja, jantando com o iPhone ao lado do prato. Há celulares ao lado das velas em jantares românticos. (...) Desde quando nos tornamos imprescindíveis para o mundo? Será que somos tão importantes assim que não podemos ficar desconectados? Por que deveríamos ser alcançados o tempo todo? Desde quando o planeta deixa de girar porque alguém não nos achou?”

Será que um dia vamos ter tempo para atender nossas necessidades pessoais, nossos afetos e sentimentos? Será que ainda conseguimos encontrá-los em meio a tantos afazeres?

O homem precisa deixar de ser escravo, apropriar-se do seu tempo, definir suas prioridades, seus limites e suas reais necessidades, deixar de se contaminar pela pressa alheia...

A briga pelo tempo já se tornou um aspecto preocupante: contamos horas, dias, meses, anos... quando vamos vivê-los?

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