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Publicado: Segunda-feira, 28 de maio de 2012

Cadernos de Música - homenagem às bandas de Itu

Lembro-me, com que saudade, nos tempos da infância, aos domingos, correr célere até a sede da Banda União dos Artistas, para acompanhar a marcha solene da corporação, tocando um dobrado, a caminho do coreto do Largo da Matriz. Era um acontecimento. Assim começava o concerto da corporação. Velhos e jovens músicos compartilhavam daquele espaço apertado, molecada sentada nos gradis laterais, para espiar melhor, para ouvir o som do baixo e o exibicionismo dos pistonistas. Praça cheia de gente, admirando o notável conjunto de clarinetes que permitia a execução de trechos de óperas italianas, a Valsa das Flores, dobrados de José Bispo, Cyro Rocha, uma infinidade de obras célebres. Dentre os músicos do naipe, admirava meu competente professor, Tabajara de Oliveira Camargo. Na flauta, o Manolo Santoro, discretíssimo músico, distinto pela qualidade de execução. O corpo de metais era mesclado entre os velhos Bruni (eram tantos...) com jovens que se iniciavam naquele tempo. Os trompetes se destacavam no repertório de música espanhola, dentre eles o Chiquito, filho do maestro que vim a conhecer melhor na Orquestra Sambrasil, nos bailes do Ituano Clube. Quem diria que o clube iria acabar!!!

Na percussão da banda o velho Eliseo, que ainda vi, em idade avançada, aguentando firme o peso do prato; batia com força a marcação sincopada do bumbo para os dobrados. Na bateria estava o Moisés de Castro e as famosas performances com as baquetas.

À frente de toda essa gente, creio que uns 40 músicos, assomava a figura ímpar do maestro Anísio Belculfinè. Era um mito, um gigante. Só não impunha medo, dada sua delicada figura, cordial, que cumprimentava a todos com gentileza, mesmo a gente que era criança, que acompanhava a banda fazendo estripulias pela rua. Hoje sei que era notável arranjador, que ouvia obras no rádio e, da partitura do piano, promovia um verdadeiro milagre, transformando a peça em linguagem da banda de música. Um busto em praça pública é pouco para ele.

Quando ouço falar da União dos Artistas é essa a imagem que me vem, Anísio, a marcha, o coreto e o público, entusiasmado, ao final de cada peça, pedindo a execução de obras, chamando-as pelo nome, tamanha era a intimidade com o repertório.

Assistir aos ensaios da corporação era outro evento concorrido. Às sextas-feiras à noite chegavam velhos senhores, de chapéu, casais, molecada, iam se acomodando nas poltronas da sede, para ouvir o ensaio. No intervalo, junto com os músicos, serviam-se do café, feito pelo Gerbar (Geraldo Barbieri).

Não tive jeito para instrumento de sopro. Talvez o método fosse também um empecilho (o Bona é uma tortura). Creio que não se utiliza mais. Sem condições de prosseguir, perdi o vínculo com a banda.

Certa vez acompanhei a corporação até Santa Rita do Passa Quatro, para o Festival Zequinha de Abreu. Já era outro tempo, quase vinte anos depois da época do Maestro Anísio. A banda não marchava mais, precisou ensaiar bastante o tocar andando, para o concurso. Desacostumados com as competições de outrora, que lhe renderam o título de Melhor Banda Civil do Brasil, era evidente o nervosismo de velhos e novos músicos, procurando harmonizar o repertório, a convivência entre as gerações e as expectativas.
Com que alegria vê-se a corporação chegar ao centenário. Participei da equipe que escreveu a história das bandas de Itu, para os Cadernos de Música, cujo volume foi lançado no sábado, dia 26 de maio. A obra reúne informações importantes, sobretudo para o registro da história dessa gente que ainda hoje deixa família em casa para longos ensaios, para realizar concertos, organizar arquivo, para encher a alma de música.

A União dos Artistas comemora a data magna com a mesma vitalidade de outros tempos. São outros tempos, portanto mudou-se a feição, transformaram-se os arranjos e o repertório, mas o vínculo com a música continua.

Ao valorizar o papel das bandas em Itu o Museu da Música – Itu poderá oferecer material fundamental para que as novas gerações, sobretudo estudantes, ampliem seu vínculo com a cidade, permitindo que conheçam e, quem sabe, participem das corporações. Assim elas permanecerão vivas e atuantes.

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