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Publicado: Quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Casa Nova

Ultimamente tenho observado minha casa com muito carinho. Tenho prestado atenção nos mínimos detalhes. Reservei um tempo especial para isso.
Havia pensado em mudar, mas mudar para onde? A mudança dá muito trabalho e tem um gostinho de fuga. Não é esta minha intenção, embora muitas vezes tenha vontade, como todos nós temos quando assoberbados por dúvidas e incertezas.
Para mudar temos que empacotar muitas coisas. Ao fazermos isso somos obrigados a remoer o passado, ir fundo nas lembranças.
Sei que a maioria esmagadora das lembranças só nos traz felicidade e alegria. Entretanto, junto com elas vem as que nos cutucam o fundo da alma, nos faz sangrar o coração. Aliás, como tudo na vida. Nada do que é bom vem só, não é mesmo? Para vivermos o bem temos que passar por momentos difíceis que, não raro, nos levam à lona.
Mas tenho consciência plena de que tem que ser assim.Afinal, todos os atuais campeões já sentiram o gostinho da derrota, já imaginaram que tudo havia acabado. Vejam o Ronaldo, não é um típico exemplo disso? E o Mandela, então?
Mas nenhum deles fica vivendo as derrotas, vivem, sim, as vitórias no dia a dia, e é isso que os mantêm vitoriosos.
Não! A opção não é mudar, ir para longe, tentar esquecer. Para mim a solução está na renovação, na desconstrução do Derrida, no reaproveitamento de tudo que tenho em minhas gavetas e armários, em minhas malas mofadas pelo tempo. Pretendo reaproveitar tudo com as lições de reorganização que me obriguei a ter pela vida afora.
Pretendo, aos poucos, claro, transformar tudo, para que me sirva de suporte mais tarde, quando terminar a pintura da casa.
Ah! É isso mesmo, em vez de mudar de casa, decidi que vou pintar a que já tenho.
Vou usar cores vivas para que possam mostrar bem a minha alegria pela renovação; vou caprichar nas escolhas para que possam refletir um pedaço do arco-íris e ter, assim, a capacidade de me transportar para os dias de criança, quando me encantava saber que havia um tesouro escondido em suas pontas, pronto para ser encontrado por quem decidisse escalar as inúmeras montanhas e atravessar os diversos vales, até chegar a ele.
Não sei quais cores vou usar, mas certamente serão alegres e demonstrarão a alegria que habitará a nova casa, já que não irei para uma casa nova. Não quero! Esta que já tenho me basta, só precisa de uma bela pintura.
Quero cuidar pessoalmente de cada detalhe. Pedir ao pintor que coloque massa em cada buraquinho das paredes internas, que não tenha medo de gastar cimento com as rachaduras, se preciso for. Meu desejo é que seja uma pintura para durar, seja uma reforma que seja notada e, não só isso, que permaneça.
Sentirei imensa alegria ao ver o encanto dos novos amigos, a serem cativados já no portão de entrada. Mas ficarei ainda mais alegre ao ver que os velhos amigos notarão a diferença e compartilharão comigo este novo espaço, e se alegrarão por poderem usufruir desta minha nova casa, uma casa renovada.
Tenho certeza de que as novas flores da entrada já dirão do perfume que se espalha pelo ambiente e passará, de forma clara, a garantia de que, ao adentrarem os antigos cômodos, ficarão deslumbrados com as descobertas.
Aqui a compreensão está totalmente renovada e revigorada; ali, a amizade ganhou um espaço maior e mais colorido; acolá, a música de um novo dia toma conta do ambiente e passa aquela sensação gostosa de esperança associada à certeza de um presente carinhoso e um futuro encantador. Uma nova casa, um novo dia, uma nova vida, um novo amanhecer.

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