Castelo de Cartas
Ninguém sabe ao certo quem inventou o baralho. Há muitas origens e datas possíveis que indicam o início do costume dos seres humanos em utilizá-lo para o lazer. Somente um extraterrestre não saberia o que é um baralho. E olhe lá, pois não duvido que os marcianos já tenham também a sua própria espécie de cartas para jogar.
Na minha infância e adolescência, tinha o luxo de ter algum tempo ocioso. Além das brincadeiras na forma de atividades físicas, também brincava com os colegas através de diversos jogos, de tabuleiro ou de baralho. Cacheta, Rouba-Monte, Dominó, Presidente, Truco e outros menos conhecidos preenchiam os fins de tarde e os finais de semana. Jogar baralho estimulava as nossas mentes, pois dependendo do jogo é necessário fazer uma série de associações e cálculos, além de estabelecer estratégias. Triste é quando a pessoa passa a jogar baralho em apostas e acaba caindo no vício.
Outra brincadeira da qual gostava muito com o baralho era o de fazer castelos. Que desafio! As cartas de papelão eram colocadas umas contra as outras, em um calculado nível de inclinação, a fim de que formassem uma base para o andar seguinte. Sucessivamente as cartas eram montadas, com muito cuidado. Era preciso ter mão firme e a sensibilidade para perceber se uma carta ou outra estremecia de repente. Também era necessária uma dose de perseverança. No meio da “construção”, um ventinho traiçoeiro entrava por uma janela esquecida aberta e colocava tudo a perder. Começar tudo de novo era a única opção.
Na vida certas coisas se assemelham a um castelo de cartas. Pense bem na sua própria vida. Você deve estar cheio de planos, de projetos profissionais, de sonhos pessoais. Deseja realizar quantas coisas em seu próprio favor, em benefício dos seus familiares e da comunidade na qual atua. Como seres dotados de inteligência, utilizamos os recursos que temos para planejar e executar ações que possam nos trazer no futuro a realização do que desejamos.
Seja profissional ou pessoal, qualquer projeto tem começo, meio e fim. Antes de colocarmos mãos à obra, planejamos tudo em nossa mente. Entretanto, como alguns gostam de afirmar a respeito de teorias, “o papel aceita tudo”. Com a imaginação acontece o mesmo. Porém, nem sempre as coisas se desenvolvem do jeito que planejamos, tomando um rumo inesperado ou nem tomando rumo algum. Há casos em que pode acontecer algo aparentemente pior: bem no meio de um projeto uma reviravolta acaba com ele sem mais nem menos. E vai-se embora todo o trabalho que tivemos. É com um castelo de cartas que derrubado pelo vento.
O que fazer nessas horas? Uma parte de nós quer desistir. Isso é normal, fruto da decepção momentânea. Alguma tristeza também é compreensível, um desânimo por ver tudo ir por água abaixo. Mas depois refletimos: não é isso mesmo a vida? Um constante montar e desmontar de sonhos e aspirações? Uma hora tudo parece ir bem e em outro momento tudo se transforma. O contrário também acontece: quando tudo parece ir mal, de repente surge uma solução e tudo se resolve.
Dizem alguns especialistas, que o grande desafio do ser humano não é superar as crises. Mesmo porque alguns tipos de crises são inevitáveis e insuperáveis, daquele tipo dos quais só resta nos conformarmos. A grande sacada é “gerenciar” as crises, termo adorado principalmente pelos gurus da administração e do marketing. Isso significa ter serenidade nos momentos difíceis, para pensar em soluções possíveis e não deixar escapar as oportunidades que surgirem. É saber que “não há mal que sempre dure” e que quando o castelo de cartas ruir, não se deve perder muito tempo “chorando o leite derramado”, sendo mais importante recomeçar, reconstruir, voltar ao trabalho.
Falar assim é fácil. Escrever sobre isso também é. Difícil é aplicar na vida, principalmente quando estamos em uma fase difícil. Mas que opção temos além de tentar e continuar tentando? Afinal, no fim das contas, o que está em jogo é a nossa própria felicidade. E por ela valem a pena alguns sacrifícios.