Publicado: Sexta-feira, 19 de maio de 2006
Ciência e poder
No feriado passado, iniciei a releitura de um pequeno livro cujo título tomei a liberdade de adotar para esse texto. Esse livro, que li pela primeira vez por meados da década de 80, é de autoria do filósofo Georges Gusdorf, da Universidade de Estrasburgo, um dos grandes pensadores contemporâneos, cuja obra se aprofundou, desde a década de 40 do século passado, nos principais problemas que preocupam o homem atual: a liberdade, a religião, a ciência, a fé, o declínio de nossa civilização.
Gusdorf nasceu em Bordeaux, no ano de 1912, fez a Escola Normal Superior, 1933-1937, foi prisioneiro de guerra na Alemanha de 1940 a 1945, e professor da Universidade de Estrasburgo de 1948 a 1976. A sua obra principal é As ciências humanas e o pensamento ocidental. Muito rapidamente, procurei saber (devido à data de nascimento) se o ilustre filósofo ainda é vivo, mas não encontrei nenhuma referência nesse sentido.
No livro, nas linhas iniciais do primeiro capítulo, o autor coloca o seguinte (não vou colocar aspas porque são várias as colocações do próprio autor): saber científico e poder político parecem feitos um para o outro, devendo seu perfeito acordo assegurar o domínio conjunto da verdade e da justiça na comunidade humana. O saber acompanha a teoria, desenhando a verdadeira imagem do mundo real e poder concerne à prática, a gestão da ordem material e da ordem social conforme as mais satisfatórias normas para o pensamento.
Logo em seguida, depois de uma análise sobre saber e poder nos primórdios das culturas humanas, o autor desmonta aquela idéia inicial, mostrando-nos que todas as tentativas para assegurar na história da humanidade uma perfeita harmonia entre o poder político e a ciência, parecem, devotadas ao fracasso. Ao contrário, nos coloca que a discordância entre ambas se acentua na medida em que o tempo passa. Com isso, o autor desmonta com a maestria o mito da santa aliança entre a Política e a Ciência, cuja união harmoniosa prometeria à humanidade a paz na prosperidade.
A ciência não é uma entidade abstrata e o poder não é uma realidade em si, de contornos bem determinados no conjunto das relações que constituem a vida de uma nação. Gusdorf continua analisando a ciência que, com seus planos intelectuais e tecnológicos prefixados, determina o conjunto de domínio cultural, instituído de um lado e de outro, diretamente e indiretamente, o conjunto do domínio econômico.
Nas conclusões do texto, Gusdorf conclui que as relações entre a política e as ciências não oferecem o reconfortante espetáculo de uma pacífica harmonia, fundamentada em afinidades comuns pela justiça e pela verdade a que os estadistas e os homens de ciência serviriam de comum acordo. O poder não está a serviço da justiça; procura a potência e a dominação. E as ciências como as praticam propõem-se, apenas secundariamente, a pesquisa da verdade; ciências do real e ciências do homem estão ligadas por exigências imperiosas do seu financiamento. A orientação do trabalho científico depende, pois, de finalidades e de prioridades impostas pelo Estado que utiliza em vista de seus próprios interesses os resultados obtidos pelo cientista.
O parágrafo final é lapidar: É preciso um verdadeiro ato de fé para crer na possibilidade de uma política do espírito e de uma ciência racional, todas as duas cooperando para o bem da humanidade. A vida humana absolutamente não se manifesta nas incertezas do tempo presente. Resta esperar contra toda esperança, se é verdade que Deus escreve certo por linhas tortas.
Gusdorf nasceu em Bordeaux, no ano de 1912, fez a Escola Normal Superior, 1933-1937, foi prisioneiro de guerra na Alemanha de 1940 a 1945, e professor da Universidade de Estrasburgo de 1948 a 1976. A sua obra principal é As ciências humanas e o pensamento ocidental. Muito rapidamente, procurei saber (devido à data de nascimento) se o ilustre filósofo ainda é vivo, mas não encontrei nenhuma referência nesse sentido.
No livro, nas linhas iniciais do primeiro capítulo, o autor coloca o seguinte (não vou colocar aspas porque são várias as colocações do próprio autor): saber científico e poder político parecem feitos um para o outro, devendo seu perfeito acordo assegurar o domínio conjunto da verdade e da justiça na comunidade humana. O saber acompanha a teoria, desenhando a verdadeira imagem do mundo real e poder concerne à prática, a gestão da ordem material e da ordem social conforme as mais satisfatórias normas para o pensamento.
Logo em seguida, depois de uma análise sobre saber e poder nos primórdios das culturas humanas, o autor desmonta aquela idéia inicial, mostrando-nos que todas as tentativas para assegurar na história da humanidade uma perfeita harmonia entre o poder político e a ciência, parecem, devotadas ao fracasso. Ao contrário, nos coloca que a discordância entre ambas se acentua na medida em que o tempo passa. Com isso, o autor desmonta com a maestria o mito da santa aliança entre a Política e a Ciência, cuja união harmoniosa prometeria à humanidade a paz na prosperidade.
A ciência não é uma entidade abstrata e o poder não é uma realidade em si, de contornos bem determinados no conjunto das relações que constituem a vida de uma nação. Gusdorf continua analisando a ciência que, com seus planos intelectuais e tecnológicos prefixados, determina o conjunto de domínio cultural, instituído de um lado e de outro, diretamente e indiretamente, o conjunto do domínio econômico.
Nas conclusões do texto, Gusdorf conclui que as relações entre a política e as ciências não oferecem o reconfortante espetáculo de uma pacífica harmonia, fundamentada em afinidades comuns pela justiça e pela verdade a que os estadistas e os homens de ciência serviriam de comum acordo. O poder não está a serviço da justiça; procura a potência e a dominação. E as ciências como as praticam propõem-se, apenas secundariamente, a pesquisa da verdade; ciências do real e ciências do homem estão ligadas por exigências imperiosas do seu financiamento. A orientação do trabalho científico depende, pois, de finalidades e de prioridades impostas pelo Estado que utiliza em vista de seus próprios interesses os resultados obtidos pelo cientista.
O parágrafo final é lapidar: É preciso um verdadeiro ato de fé para crer na possibilidade de uma política do espírito e de uma ciência racional, todas as duas cooperando para o bem da humanidade. A vida humana absolutamente não se manifesta nas incertezas do tempo presente. Resta esperar contra toda esperança, se é verdade que Deus escreve certo por linhas tortas.
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