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Publicado: Terça-feira, 3 de maio de 2011

Déficit de Atenção ou Déficit de Coração?

Déficit de Atenção ou Déficit de Coração?
Estamos ensinando as crianças a desistirem da vida

A cada dia que passa ouço e leio mais histórias sobre o problema diagnosticado como “Déficit de Atenção” nas escolas e nos consultórios pediátricos. Explicando com palavras simples, trata-se de crianças muito agitadas, dizem, que precisam tomar remédio para se acalmar. O nome chic da “doença” é Transtorno por Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

Participo de alguns grupos de discussão sobre educação no Facebook e novamente veio à tona esse assunto. A jornalista Samantha Shiraishi alertou para duas notícias publicadas hoje, no mesmo veículo (Folha).

1) Quase 75% das crianças e dos adolescentes brasileiros que tomam remédios para deficit de atenção não tiveram diagnóstico correto.

2) Novo remédio para o tratamento de déficit de atenção começará a ser vendido no Brasil.

Isso é assustador! Eu costumo ser muito otimista e animada. Mas quando leio esse tipo de coisa, confesso que desanimo. Em que mundo estamos vivendo? Como pode ser possível as pessoas se anestesiarem a esse ponto? Nunca vivemos em uma época com tanta liberdade. No Brasil principalmente, que abriga tanta diversidade cultural, temos a chance de escolher quase tudo. Temos todas as informações ao alcance de um click. E o que estamos escolhendo?

Sim, infelizmente o déficit de atenção é bem grande. Mas erramos o alvo. O maior déficit de atenção é dos adultos! Déficit de atenção em primeiro lugar com a nossa alma. Em decorrência disso, o resultado é um déficit de tempo para viver a vida, para dar atenção ao que realmente importa, para ouvir o coração, para cuidar da saúde, para ser generoso com os sentimentos alheios, para respirar paz interior. E assim, no frenético corre-corre de obrigações e agendas lotadas... Rotulamos! Simplificamos! Buscamos soluções em caixinhas! Esquecemos da ética e da dignidade. Pisamos na infância! Lamentavelmente esquecemos o que é ser criança. E impedimos a manifestação da vida.

Vida é tudo aquilo que pulsa dentro de nós, no anseio de se expressar em cores, sabores, aromas, imagens, sons, palavras e gestos. Todos os sentidos! Tudo o que não cabe dentro de tão profundo que é. Tudo o que borbulha em nossas células, à imagem e semelhança do universo. Vida são todas as possibilidades de existência. Vida é diversidade! Vida é o bem mais sublime que habita o nosso ser. Ao rotular e encaixar esse pulsar dentro de um modelo (seja qual for) estamos assoprando as velas que iluminam a vida. Só sobra a fumaça cinza e enevoada. Tudo fica turvo, opaco, sem graça. Tudo se acalma, é verdade. Mas é uma calma de desistência. Estamos ensinando nossas crianças a desistir da vida.

Escrevo como forma de apelo e desabafo. Quero um mundo melhor para os meus filhos e para todas as crianças da terra, que estão nascendo com uma sabedoria tão maior do que a nossa! Quero que elas sejam acolhidas com seus talentos e dores, amadas nas suas perfeições imperfeitas. Que sejam ouvidas com a simplicidade do coração e não com a complexidade da mente. Que não sejam rotuladas, humilhadas e engessadas por nós, sábios adultos. Que nossas crianças naturalmente desabrochem em beleza como uma flor, respeitando o tempo que necessitam para florescer. Esse tempo certamente não é o da “grade” escolar, da agenda lotada ou dos ponteiros do relógio. Porque a vida não cabe nessas coisas.

Eu me pergunto e sei a resposta: Estamos com a síndrome do déficit de atenção ou do déficit de coração?


Para ler mais sobre esse problema comum e atual, escolhi dois artigos publicados por mães e educadoras que viveram na pele histórias assim. Leia e compartilhe também os seus exemplos de vida.

- Transtorno por déficit de atenção com hiperatividade (TDAH),  por Samantha Shiraishi

- Educação: o instinto dos pais conta muito, por Simone Miletic

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