Diploma de insensatez
O título desta crônica – Diploma de Insensatez – toma-se emprestado de matéria veiculada na revista VEJA, recente, eis que do dia 22 de agosto, assinada pela jornalista Júlia Carvalho.
Há de merecer golpe inexorável que a enterre definitivamente, a ação infeliz do Senado, de ressuscitar a exigência de diploma para a mais espontânea das profissões, a de jornalista. Aguarda-se que a sensatez triunfe, vez mais, reparando o desatino da Câmara Alta, que cede a uma pressão mal dissimulada de faculdades de comunicação. De se esperar que na Câmara dos Deputados, essa pretensão seja sepultada em definitivo.
O Supremo Tribunal Federal, sob parecer do relator, ministro Gilmar Mendes, já havia tornado sem efeito a inócua obrigatoriedade de diploma, para uma ação que é inata do ser humano, a de escrever, desde que se entenda de sua lavra a correção, objetividade e estilo, qualidades que brotam por si, a quem assim o seja. Algo intrinsecamente intuitivo no jornalista verdadeiro e autêntico – o jornalista nato. Esse tipo de personagem não se fabrica nem se molda ou amolda em carteiras de escola – quem não sabe?
Salvem-se tão somente aqueles que cursaram alguma das extintas faculdades ou cursos e que, ao ali entrar, já davam provas de vocação inequívoca e compunham textos de matiz condizente. Aos que se matricularam ou até tenham se formado, despidos desse requisito natural, não serão transformados em profissionais capazes num passe de mágica. Jamais. Impossível inocular à força o dom do estilo fluente e correto.
Há, no entanto, uma razão ainda mais convincente para a não exigência da obrigatoriedade, que é a de que ela já nascera maculada. Criada pela ditadura com o propósito único de exercer controle sobre a mais sagrada das liberdades, a de o homem pensar e se expressar. Esse golpe data de 1969 e se sustentou assim por quarenta longos anos, até vir a ser extinto pelo STF em 2009. E não há o que mais cause constrangimento do que a limitação para se comunicar ao público por escrito, com talento e responsabilidade.
É de se perguntar: e nestes três anos de liberdade recobrada – a fase atual – fez o diploma alguma falta? A imprensa por isso perdeu qualidade?
E no passado então, antes de 1969? De onde fluíram jornalistas brasileiros da melhor têmpera, capazes de atrair e prender leitores, a ponto de irem eles sôfregos aos responsáveis pela página diária, semanal ou mesmo temporária dos jornais e revistas?
Ressentem-se de algum malefício os Estados Unidos, a França, fonte de cultura e a Espanha, nos quais é livre a prática do jornalismo responsável?
Imprensa – um vocábulo que dispensa adjetivação.
O seu próprio e límpido enunciado – imprensa – traz no bojo o caráter indispensável de liberdade.
Livre, a imprensa cumpre missão preponderante.
Sob condicionamentos, perde autenticidade.
O diploma, um meio de cercear.
Disse-o bem Júlia Carvalho: diploma de insensatez.
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