Drama da noite
Serviu-se do chocolate quente, soltando sua fumaça doce sobre o fogão, pegou a cuia com biscoito de maisena na mesa e partiu para a sacada do apartamento. Ali se acomodava em seu ritual de observação da prostituta que fazia ponto na calçada em frente. Já era passado a meia-noite quando parou o primeiro carro com o desejo latente das noites. Então ele se ajeitou na poltrona, chegou a caneca no rosto para respirar o aroma quente e cruzou os dedos. Experiente na rua, ela não se aproximou, mas insinuou sua disponibilidade ajeitando o cabelo, a echarpe em crochê e piscando sensualmente pro diplomata, que disse algo, mas ela negou com a cabeça e passou a ignorá-lo olhando para o fim da rua na esperança de um novo cliente. O pobre continuou falando, depois gesticulou irritado e saiu cantando os pneus. O vento soprava sua música gélida madrugada adentro e sem mais nenhuma emoção especial. A própria cidade ia sem o movimento usual. Ela atravessou a rua, tomou o elevador, abriu a porta do apartamento, foi até a sacada, jogou a echarpe no colo do marido e chorou.
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