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Publicado: Terça-feira, 3 de novembro de 2009

E a fome?

Já escrevemos sobre a cidade e o campo...

Parece que, sem muita opção, a população optou pela cidade...

A sociedade vive da economia e para a economia. Esta se baseia na produção e no consumo. É um círculo fechado: estimula-se o consumo através de uma massificação – a felicidade está no poder comprar, no consumir, no ter -, garantindo a produção. O lucro fica assegurado e permanece nas mãos dos grandes, porque a distribuição não é justa. Essa pequena minoria acaba ficando com quase tudo e a maioria se vira como pode, com o pouco que lhes sobra.

Sem dúvida, uma situação totalmente injusta, desigual, predadora, escravizante, que explica o grande desequilíbrio social em que vive o mundo moderno.

A fome entra nesse cenário como a ponta do iceberg. Segundo os estudiosos, vai faltar alimento e, se nada for feito, ela vai dizimar o planeta, direta ou indiretamente, através das doenças que se tornarão impiedosas frente à inanição dos seres humanos.

Veja-se o texto de Dom Odílio Scherer, para a Campanha da Fraternidade de 2007: “A população amazônica vive a pressão da mundialização e da urbanização, que perturbam sua cultura e a fazem perder suas raízes, suas riquezas e sua identidade. A urbanização acelerada levou grande parte do povo do interior da Amazônia a morar em alguns centros urbanos, onde faltam serviços de atendimento às necessidades básicas da população, trabalho e habitações; como resultado, surgiram imensas palafitas e favelas, o tráfico de drogas, a prostituição, até mesmo infantil, e tanta violência.”

Por toda parte, a cidade ganhou prioridade absoluta, mas como bem sabemos, não sobrevive por si, já que não produz seu próprio sustento; poderíamos dizer que ela é parasita da área rural. Em contrapartida, é soberana na produção de resíduos e na poluição.

O que foi feito dos homens do campo, da população rural?

Não é necessário um vasto conhecimento das ciências para perceber que o nosso país tem uma geografia das mais privilegiadas do planeta. E por que não fazemos jus a isso? Por que não somos ainda o celeiro do mundo? Por que não temos áreas maiores e mais bem cultivadas? Parece que estamos precisando apenas de uma séria política agrária... que estimule as pessoas certas.

A paisagem rural mudou rapidamente: ao viajarmos pelas nossas rodovias, sumiram da nossa vista os pontos habitados e coloridos de diferentes verdes, culturas diversificadas, pequenos produtores dos alimentos básicos para o nosso dia a dia; sumiram as famílias rurais cuja sobrevivência, antes garantida, hoje se tornou impossível. O que vemos é a uniformidade do verde, campos homogêneos a perder de vista, latifúndios, “tocados” a máquinas.

É vasta a literatura sobre os riscos das monoculturas, guiadas pelo econômico, pelo lucro e nunca pelos interesses do bem comum, da preservação, do cuidado da terra, do clima, dos rios, da vegetação...

A revista “Família Cristã” de dezembro de 2007 traz um alerta sobre essa febre do biocombustível e do perigo de que ele possa fazer a fome avançar.

Segundo a ONU, 854 milhões de pessoas sofrem com a fome e o problema continua em ritmo ascendente.  O relatório da ONU indicou que 6 milhões de crianças menores de 5 anos morrem todos os anos de fome, ou de causas relacionadas a ela. Quanto ao futuro, o relator Jean Ziegler se mostrou pessimista em função do crescimento das fronteiras agrícolas  destinadas aos biocombustíveis, que poderão  piorar as condições de produção de  alimentos. “Os biocombustíveis terão como sequela a fome” - afirmou.

Dom Helder dizia: “Quando dou de comer aos pobres, chamam-me santo, quando pergunto por que é que os pobres têm fome, chamam-me comunista”. Mas é preciso perguntar de onde vem a miséria de tanta gente. Por que uns têm de tudo e com sobra, enquanto a outros falta o indispensável? Não seria a ânsia de riqueza, de poder, de conforto, de prestígio?

Felizmente, parece que algumas potências econômicas (pessoas ou instituições) começam a perceber que, se não abrirem as mãos, ficarão sem saída, encurralados na própria política social praticada com selvageria.

O êxodo rural, seja qual for sua causa, acabou provocando um abandono da área rural, já não mais explorada e cuidada carinhosamente pelos seus proprietários, como parte de sua família, sua terra, seu chão, seu “lar”. Agora os donos da terra guardam com ela uma relação interesseira e pouco amorosa, de exploração e de lucro.

Parece boba a afirmação, mas precisamos reaprender com os índios, senhores da terra por muito tempo, como eles conseguiram explorá-la para viver, sem colocá-la em risco. Eles a trataram como mãe-terra, fonte de vida e não unicamente como fonte de riqueza. É bom começar a pensar seriamente, antes que seja tarde demais!

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