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Publicado: Terça-feira, 29 de novembro de 2011

Elogio ao Patrono Dom Gabriel Paulino Bueno Couto

Crédito: Juliano Christofoletti Elogio ao Patrono Dom Gabriel Paulino Bueno Couto
Discurso na posse da Academia Ituana de Letras

        Há muito não sentia uma alegria como esta. Na presença de tantas e queridas pessoas, posso partilhar este momento especial do meu Elogio ao Patrono, que para mim é como se fosse uma espécie de formatura: o ato que oficializa minha posse na cadeira número 27 da Academia Ituana de Letras.

        Invejo saudavelmente os que tiveram a graça de conhecer pessoalmente o meu Patrono, Dom Gabriel Paulino Bueno Couto. Quando ele faleceu, em 11 de março de 1982, com seus 72 anos de idade, estava eu ainda no início da minha infância.

Não farei aqui uma simples leitura da biografia de Dom Gabriel, pois isso me parece um tanto frio e protocolar. Mesmo não tendo convivido pessoalmente com ele, prefiro falar o que sua figura representa em minha vida; o que representa para os ituanos; o que representa para a Igreja Católica.

Ainda adolescente, lembro-me de quando vi pela primeira vez uma foto do nosso primeiro bispo diocesano. Que homem franzino! Uma magreza que adiantava sua fragilidade física. Minha admiração só aumentou à medida em que fui conhecendo sua história e sua obra. “Quando sou fraco é que sou forte”, diria ele parafraseando o apóstolo Paulo.

O jovem Gabriel Paulino sempre se destacou pela fé que trazia no coração e por sua piedade. Quando deu asas à vocação sacerdotal, ingressando no seminário, não foi uma surpresa para os que o conheciam. Abrigou-se sob o manto da Virgem do Carmo para se tornar um baluarte do nosso clero, um verdadeiro santo. Ituano e santo, gente desta terra que habitamos.

Ordenado em Roma, no ano de 1933, ficou na Itália estudando e exercendo funções na Ordem Carmelitana até 1946, quando foi nomeado Bispo Auxiliar de Jaboticabal. Nesses anos europeus é que adquiriu a terrível tuberculose, o que lhe fez viver os anos seguintes com apenas um dos pulmões. O corpo, frágil. A alma, cada vez mais forte.

A partir disso Dom Gabriel jamais respirou normalmente, como qualquer um de nós. E desde então ele dedicou mais ainda todo o seu fôlego, todo o seu intelecto, toda sua alma e coração ao Reino de Deus, levando Cristo para quem não o possuía e tornando consciente de Cristo aqueles que já o tinham.

Outras cidades tiveram a chance de respirar o mesmo ar santo de Dom Gabriel Paulino: Curitiba, Taubaté, São José dos Campos, São Paulo e Jundiaí. Foi um ituano o primeiro bispo da Diocese criada em 1967.

Uma pessoa nunca morre se deixa exemplos dignos de lembrança e admiração. Por isso Dom Gabriel partiu, mas não morreu. Continua vivo na memória de muitas pessoas. E foi através dessas memórias, de um relato aqui e outro ali, que pude conhecer aos poucos e admirar aos muitos este meu Patrono.

Foi homem culto, mas com a inteligência dos simples. Foi homem de razão, mas com a sabedoria dos místicos. Foi homem de fé, de esperança e de caridade, mas sem deixar de proclamar suas profecias para a sociedade, cada vez mais atribulada pelas modernidades.

Foi homem das Letras e homem das Artes. Escreveu poemas, diversos livros e orações. Pintou quadros e fez esboços. Fez da sua vida e vocação uma verdadeira obra-prima, daquelas que o Criador certamente deve se orgulhar em ter criado.

Ouvi muitas histórias sobre Dom Gabriel. Em todas, os interlocutores concluíam dizendo: “Era um santo em vida”. Viveu radicalmente a pobreza, a obediência e a caridade. Radical como o próprio Cristo, que entregou a vida no madeiro.

Li e reli muitas coisas sobre Dom Gabriel Paulino. Duas de suas máximas ficaram impressas no meu coração, por pura identificação pessoal.

A primeira:

“Odiar uma coisa é muito grave, porque é destruí-la. O ódio atinge as aparências e a essência. Quando odeio, quero que a coisa não exista, não seja, isto é, destruo a sua realidade. É o ato mais desumano que há. O amor é o ato que mais realiza o homem. Faz sua a realidade da coisa que ama, traz para si a realidade da coisa amada. O amor constrói. Amar é querer a realização do outro. Amar é aderir à realidade do outro”.

E a outra:

“Voto de pobreza é para libertar a alma, para que ela possa se unir mais a Deus. Se somos pobres, em Cristo somos ricos, porque a pobreza sem Cristo é miséria e em Cristo é libertação. É por Cristo, com Cristo e em Cristo, que o indivíduo homem recupera a sua verdadeira identidade, a de filho de Deus, perdida pelo pecado original. E pelo homem, com o homem e no homem, assim reconstituído, Cristo continua sendo a revelação de Deus-Amor”.

As palavras de Dom Gabriel contra qualquer tipo de ódio acabam servindo também como um hino ao amor. Lembrando que, para alguém da minha geração, é obrigatória a citação do “É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã... Porque se você parar para pensar, na verdade não há”.

As palavras de Dom Gabriel a favor da pobreza não soam como alienação político-social. E isso porque vemos na pobreza a busca constante pela simplicidade e pela humildade, tendo como guia a Virgem do Carmelo, ela tão simples e humilde em toda a sua vida. Estamos aqui hoje com ternos, vestidos e sapatos. Com cargos, títulos e mandatos. Mas nossa essência está além das aparências e da temporalidade. Aos olhos de Deus somos apenas o que somos, eis a nossa verdadeira identidade.

Tive outra graça em minha vida: a de contar com uma pessoa que me ajudou a saber mais sobre Dom Gabriel Paulino, além de me dar um exemplo diário de como estar verdadeiramente à serviço de Deus e da humanidade, para construir um mundo mais justo, fraterno e solidário.

Falo do saudoso Dom Amaury Castanho, terceiro bispo diocesano de Jundiaí, que na Roma Brasileira passou os últimos anos de sua vida. Tive a honra de ser seu aprendiz, levado por ele a trabalhar no setor de Comunicação da Diocese de Jundiaí, no ano de 2003.

Dom Amaury foi um dos membros fundadores desta Academia Ituana de Letras e ocupou a cadeira número 27 até a sua morte, em 2006. Foi meu mestre, meu pai e meu irmão. Com ele aprendi a lidar com os bastidores da Igreja, com as peculiaridades da fé, com as manhas da política e com o cotidiano da Imprensa.

Com ele aprendi a ter o zelo exagerado do discípulo fiel. Aprendi a ter esperança diante das adversidades, com o rosário em uma das mãos e a Sagrada Escritura diante dos olhos. Com ele aprendi a autocrítica, exercício que praticávamos constantemente, com base no amor fraterno e até com muito humor.

Dom Amaury e eu estávamos unidos por muitas afinidades e também pela admiração a Dom Gabriel Paulino Couto. Quantas conversas e confidências trocamos nas inúmeras viagens de Itu a Jundia&iacut

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