Entre risos e lágrimas
Solidão
Loredana e Lizeloth viviam juntas na velha casa onde tinham nascido e passado toda a sua vida, até então.
Solteiras, não tinham muitos amigos, faziam companhia uma à outra nos afazeres domésticos, nos passeios, nas viagens.
Pensavam que acabariam suas vidas assim, mas aconteceu o inesperado.
Lizeloth conheceu um novo colega de serviço, apaixonaram-se e em pouco tempo resolveram casar-se.
Loredana viu-se possuída de sentimentos contraditórios. Surpresa? Inveja? Mágoa? Medo?
Lizeloth mudou muito. Parecia uma adolescente no entusiasmo dos preparativos para o casório.
Fez questão de ter tudo o que tinha direito. Festa de noivado, chá de panela e finalmente a cerimônia com a igreja cheia de gente, festança até de madrugada, lua de mel numa estância da moda..
Loredana, com muito tato, tentou lembrar-lhe que era uma quarentona e ficaria ridícula numa exposição assim, mormente por ser o noivo quase dez anos mais novo.
Lizeloth não quis saber de nada. Estava se casando e tinha direito de exibir a sua felicidade, de usar o vestido de noiva e a grinalda de flores de laranjeira, pois não tinha ela permanecido virgem até então?
Loredana acabou se envolvendo também e ajudou a irmã em tudo que pode para que o seu grande dia fosse perfeito.
Vestida de noiva, caprichosamente penteada e maquiada, sorrindo, transbordando alegria, Lizeloth estava linda e nem parecia ter a idade que tinha.
Começava sua nova vida cheia de esperanças enquanto a irmã ficava só.
Ela e o noivo a convidaram para morar com eles, mas ela recusou.
Também não quis ficar na velha casa cheia de recordações.
Preferiu um apartamentozinho montado a capricho, tudo novo, onde começaria uma nova vida como a irmã, só que sozinha.
No dia mesmo do casamento, terminada a festa, dirigiu-se a sua nova morada.
Estava cansada, emocionada, sem saber muito bem analisar o que sentia.
O apartamento que montara com tanto capricho não parecia ser a sua casa, o seu lar, mas uma mera exposição de móveis e objetos de decoração.
Não conseguiu dormir. Sentia saudade da irmã que deixara há poucas horas. Como seria a sua noite? Seria tudo tão maravilhoso como ela esperava?
Pela manhã levantou-se e ficou por ali sem saber o que fazer, pouco a vontade com uma sensação estranha de estar fora de casa ansiosa para retornar.
As horas arrastavam-se lentamente e ela gostaria de apressá-las, não sabia bem por quê.
Que diferença fazia se era hoje ou amanhã se todos os seus dias seriam, agora, iguais, solitários e vazios?
A campainha tocou. Quem seria?
Elisabeth
Uma garotinha com uma caixa na mão fitou-a com dois maravilhosos olhos azuis e perguntou:
- Você sabe jogar Mico Preto?
- Não sei, mas vamos ler as instruções.
A menina acompanhou-a até a mesa da cozinha onde espalharam as cartas e começaram a jogar.
Loredana trouxe um batom e explicou que cada vez que uma delas acabasse o jogo com o mico na mão, a outra fazia uma marca no seu rosto com o batom.
- A menina disse que se chamava Elisabeth e riu quando Loredana lhe contou o seu nome
- Que nome esquisito! Parece o nome daquela coisa que tem na frente dos carros.
- Pára-lama! Qual a semelhança? Mas, tudo bem, você pode me chamar de Lô, Tia Lô, está bem?
O importante é que Loredana estava se divertindo com a garotinha e as horas passaram sem que ela percebesse.
De repente lembrou-se de perguntar:
- Sua mãe sabe que você veio aqui?
- Minha mãe está viajando.
- E quem está tomando conta de você?
- Meu pai
- E você pediu a ele para vir?
- Não. Ele está tomando banho.
Tranquilizou-se. Quando ele saísse do banho ia dar pela falta da menina e imaginaria logo que ela estava em algum apartamento vizinho.
Quando Loredana foi atender a porta de novo, outro par de olhos azuis a fitaram e logo em seguida, ouviu uma gargalhada e simultaneamente o grito da Elisabeth:
- Pai!
Ainda rindo ele perguntou:
- Mas o que é que vocês estão fazendo?
Só então Loredana lembrou-se que estava com a cara toda pintada, tal como a Elizabeth.
Instintivamente passou a mão borrando ainda mais.
- Desculpe, achei graça da cara de vocês duas
- Eu vou lavar o rosto, por favor, me espere um pouco...
- Não se preocupe. Vim só buscar a Beth, Desculpe a sua invasão. Ela não esta
acostumada a morar em apartamento. Pensa que o prédio todo é sua casa e que ela pode andar livremente pelos corredores e até entrar nas casas dos vizinhos.
- Pois aqui ela pode vir quando quiser, já somos grandes amigas, não é mesmo Elizabeth?
O rapaz despediu-se:
- Meu nome é Sérgio. Eu e a Liz moramos ali no 71..
Loredana ficou impressionada com o pai da Elizabeth. Que homem bonito! Que olhos! Que sorriso! Que leve perfume de banho tomado!
Policiou-se:
- Cuidado! Não vá se apaixonar depois de velha feito a Lizeloth1 Ainda mais que ele é casado....
Ficou meio intrigada. Segundo a menina, a mãe viajou e deixou-a com ele que parecia bem desligado, pois só deu pela falta da filha horas depois de ela ter saído de casa.
Não era de seu feitio meter-se na vida dos outros, mas estava irresistivelmente curiosa a respeito do charmoso visinho.
Depois disso, encontraram-se algumas vezes no elevador, Ele sempre sozinho ou com a Betinha e às vezes trocavam rápidas palavras depois do cumprimento.
- Quando é que você vai de novo jogar comigo?
Elisabeth olhou para o pai e foi ele quem respondeu:
- Ela está de castigo. Não pode sair de casa o resto da semana.
- De castigo? Que foi que você fez?
-Imagine que a encontrei escorregando no corrimão da escada no sétimo andar!
- Verdade? Você não pode fazer isso! Vá jogar mico preto comigo que é bem menos perigoso!
- Mas eu estou de castigo...
- Você está de castigo. Não pode sair de casa, mas se a Lô quiser ir jogar lá em casa será um prazer.
Loredana sentiu faltar o chão sob seus pés.
E agora? Como aceitar tão inesperado convite? No entanto, como podia recusar?
Saiu pela tangente:
- Estes dias estou muito ocupada, mas assim que tiver um tempinho eu vou, sim.
Ela sabia que a Elizaberh ia insistir no convite e já estava pensando em que desculpas poderia dar, pois, é claro que não podia meter-se na casa de um vizinho desse jeito.
E ele a perturbava cada vez mais.
Marta
Loredana abriu a porta e lá estava a Betinha de mãos dadas com uma mulher ainda jovem.