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Publicado: Terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Estava escrito

Estava escrito

Já falei mil vezes – e que mal existe em dizer de novo? – sobre uma confessada mania, incontrolada tendência, a de escrever no verso de folhas e papéis de toda espécie, sobretudo se é amplo o espaço em branco.

Neste presente caso, tenho na minha frente um programa de evento ainda do ano de 2014. Papel firme, uma quase cartolina. Tirei-lhe as medidas: 43 por 30 centímetros. Devem caber então aqui, alguns pensamentos.

Nesse sistema, pois, o trabalho é dobrado, eis que de todos esses rabiscos, há que levá-los computador.

Demente eu? Sei lá.

Disso , porém, nunca me acusaram, nem os daqui de casa. Sequer deixo de confessar que esses talvez não tenham me censurado por puro respeito...

Olha só do que me ocorre: do fato de que, decididamente, nunca ousei versejar.

Faço reparo nesse pormenor de apenas duas ocorrências. Exceções.

A primeira, nos meus prováveis dezessete anos – por aí. Pouco mais, pouco menos. Exaltava a meu modo a magnificência do idioma pátrio, herdado de além-mar, sabem todos. Feitura de apenas três míseras estrofes, desaparecidas num caderno que sumiu. A memória permite citar apenas o final da derradeira. Nela, quis realçar as chances infindas da nossa língua, rude e terna, ao sabor do que se deseje expressar. Falava eu, pois, que o contraponto de sua intensidade, casava também com a leveza e ternura. Mas, de tudo, só consigo recordar o seu fecho, a dizer:

 “... tua ternura e leveza tais são, que pareces uma pena martelando o algodão”.

Houve uma segunda vez.

Bem mais recentemente, algo de presumíveis quatro ou cinco anos (seria isso?);  aí então, deveras num repente produzi alguma coisa. Veio como um furacão e saiu essa que fecha o colóquio de hoje. Intuitiva, inesperada, sem retoques, surpreendente; as frases se alinharam num quase milagroso repente.

Essa eu guardei.

Sem revisão, insisto, sem remendos. A sua espontaneidade não autorizaria dizer nem quantos minutos demandou sua feitura . Cinco... Quatro... Pura, rápida, sem revisão ou acertos.

Muito recentemente, em ocasional e recente encontro e que, desde então, se transmudou para contatos frequentes, caiu ela perante a vista de consagrado gramático, autor de várias e notáveis obras no ensino do português. O insigne mestre viu nesse poema a parecença com o estilo de um poeta de renome. Tanto foi o susto, que na hora enrubesci a ponto de nem apreender de quem se falara ou quem fora ele. E tampouco o pudor autorizou-me a perguntar depois quem seria.

Creiam. Aconteceu.

O papel, a esta altura, já quase sem espaços.

Urgente enveredar para o seu fecho.

Falei com o coração e assevero que, não obstante essa contingência, a respeito de versos, tudo parou por aí.

Vejam.

 

 

ESTAVA ESCRITO

 

Treze anos, se tanto.

Pouco mais, quem sabe menos...

Como a plaina, empunha tão bem!

A plaina só? Todas as ferramentas, isso sim.

Do genitor, tudo aprendera.

 

Cai-lhe a veste longa,

Suja as barras, no fim do dia.

Quiçá dele não fora a indumentária,

ganha ou de vizinhos herdada,

que irmãos não tivera.

 

Para a idade tenra, ensimesmado,

Às vezes, no infinito o olhar posto

e ao de repente, com os amiguinhos de novo.

 

Se falante ou quieto,

tímido ou desenvolto,

de sua infância e juventude,

pouco se apurou.

 

Sabe-se-lhe entanto, a cultura,

comprovada,

eis que, com até doutores disputou.

 

Genitora aflita.

Pai, de mãos na cabeça.

Cadê o menino, onde ficara?

Mais ainda que a festa acabara.

 

Pós tríduo de aflições, divisam-no,

O menino, sereno, e já a ensinar.

Doutores pasmos, à sua volta.

 

Aos pais serena,

que lhe cumpria,

daquilo se ocupar.

 

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