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Publicado: Sexta-feira, 16 de maio de 2008

Eu Por Mim Mesmo - Parte 2

Do Pinguinho e da Pituca, dos amores inocentes e de ver que aos 21 anos nada mudou
 
Aos seis anos de idade, minha família trocou a Vila Nova pelo bairro Alberto Gomes. A casa era bem maior, mas minha irmã e eu continuamos a dividir o mesmo quarto. Porém havia um quintal enorme, com várias árvores frutíferas como mangueiras, macieiras, laranjeiras e limoeiros. Espaço para as molecagens não faltavam.
 
O espaço era tanto, que até cachorros podíamos ter. Não que deixássemos de os possuir na casa antiga. Ainda na Vila Nova, lembro-me do Pinguinho. Era um cão malhado e muito peludo, além de medroso.
 
Certa vez minha mãe contratou um fotógrafo para registrar algumas poses dos meus três anos de idade. Em uma das poses, o sujeito resolveu que Pinguinho devia aparecer na cena comigo. Colocou o cachorro no sofá, perto de mim, e bateu o flash. No mesmo instante, senti o mundo ficar mais úmido: apavorado com o relâmpago repentino, Pinguinho me encheu de vários pinguinhos, urinando em mim...
 
Na casa do Alberto Gomes, tive outros cães. Estava um dia a dormir, quando senti no quarto uma movimentação estranha: a luz acesa e um burburinho. Ao mesmo tempo, algo a se movimentar em meio aos meus lençóis. Abri os olhos, curioso. Vi meus pais sorrindo e uma filhote na minha cama. De pêlos pretos e com uma mancha branca no peito, demos a ela o nome de Pituca.
 
Pituca era a meiguice em pessoa, se pessoa fosse. Às vezes, penso que era mais humana que alguns humanos. Nas minhas frustrações infantis, quando aos poucos ia percebendo o que era o mundo dos adultos, a cadelinha me consolava.
 
Sentava-me no corredor externo para chorar, depois de alguma sova por conta das traquinagens. E Pituca externava sua solidariedade sentando-se ao meu lado, lambendo as minhas mãos e fazendo festinha para que me alegrasse.
 
Durante minha adolescência, Pituca se fez presente. Morreu com dez anos de idade. Certa vez, eu já com meus 18 anos, cheguei em casa como de costume. Encontrei Pituca quieta num canto do quintal.
 
Estava dura, os olhinhos sem brilho, morta. Embrulhei-a em jornais, coloquei-a em um saco de lixo e à noite os lixeiros a levaram, triturando-a. De certo modo, com ela morreu também um pouco da inocência da minha infância.
 
A adolescência, porém, foi feliz. Época de conhecer pessoas e fazer amizades que duram até hoje. Tempo de muitas descobertas, tanto nos estudos quanto na vida. Conheci pessoas, meninos e meninas, dos quais tenho a amizade sincera, creio que até o fim da vida.
 
Foi a época das tensões das provas do ginásio, sempre estressantes. Foi a época de conhecer a cidade de bicicleta, pois eu tinha pernas fortes e rodava muito por aí. Foi a época do primeiro beijo e da descoberta daquele amor inocente de criança, onde o gostar é sincero por si mesmo.
 
Com 15 anos, conheci a Igreja e dela comecei a fazer parte. Fiz muitos amigos nas comunidades pelas quais passei. Aos 17 anos, vivi com intensidade o meu primeiro “namoro sério”, daqueles nos quais a gente ia buscar a namoradinha na porta da escola para escoltá-la até em casa. No ano seguinte, passei pelas emoções de ser ou não selecionado para o Exército. Depois de uma semana “visitando” o Regimento Deodoro, fui solenemente dispensado, de acordo com o meu desejo e orações.
 
Quando fiz 21 anos, chegou a maioridade. Eu já era responsável por mim mesmo há certo tempo, trabalhava e tentava cuidar da minha vida sem dar muito trabalho aos meus pais.
 
Pensei que acordaria diferente, mas que nada. Olhei-me no espelho e percebi que o tempo, assim como a idade, só tem sentido quando observado em lotes. De um ano para outro, nada parece mudar. Porém, se refletimos por qüinqüênios ou decênios, vemos claramente o quanto as coisas se alteraram.
 
Entre os meus 10 e 20 anos, praticamente passei a ser o que sou. Os pensamentos, as idéias, as convicções. E nesse período Deus colocou-se diante de mim, para minha sorte. Pois tudo o que sou hoje, deve-se ao Criador.
 
Amém.
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