Eyjafjallajoekull. O mundo não está acabando
Resolvi escrever sobre o vulcão na Islândia. Primeiro fiquei aliviado por ter de escrever sobre o tema ao invés de falar sobre ele, pois se tivesse de pronunciar o nome do vulcão: Eyjafjallajoekull, teria de desistir da coluna. Enfim, aqui estou com a cabeça nas nuvens. Ou especificamente, na nuvem.
Escutei muitos suspiros e exclamações sobre o que está acontecendo. Realmente é algo impressionante se pensarmos do ponto de vista de nossa arrogante e inconsequente sociedade. Nossa ilusão de soberania sobre o planeta e os fenômenos naturais. Mas é absolutamente simples quando entendemos que o planeta tem seu comportamento natural e seu movimento, assim como cada um de nós. Escutei frases como: a natureza está mostrando a sua força e fazendo o homem respeitá-la. Nós não nos relacionamos com a natureza desta forma. Não nos relacionamos de igual para igual em um duelo de forças. Fazemos isto apenas em nossa ilusão, pois não estamos acima dela. Somos apenas parte dela. Quando coisas assim acontecem, não é para nos punir. Talvez uma chance para despertar nossa consciência. Um puxar de orelhas materno. Acontecem apenas porque, ao contrário do que muitos dizem, o mundo não está acabando. Ele está apenas continuando. E ele está vivo.
Quando eu tinha apenas um punhado de anos, morava em uma casinha em um bairro tranquilo de São Paulo. Pela manhã saía pra ir à escola e via um passarinho brigando com seu reflexo, projetado na calota do carro do meu pai. Ele bicava a calota, mas não tinha como vencê-la, pois apenas na cabeça dele havia uma disputa. Assim é nossa luta com a natureza. Ela está apenas viva, e nós somos parte disto, por isso somos afetados por seus movimentos. Por mais que isto afronte nossa arrogância humana e não nos permita mais fingir que somos soberanos e dominamos o mundo.
Quando um agricultor encontra uma chuva torrencial ele espera. Espera até que a chuva pare, pois assim é o ritmo da natureza. Construímos o mundo e as relações ignorando que a natureza é absolutamente soberana, por isso quando algo assim acontece temos a sensação de que o mundo está revoltado conosco e temos medo dos tempos obscuros que virão.
É claro que é emocionalmente terrível descobrir que não poderá voltar pra casa e amanhecer com a família após uma viagem de negócios. Ou descobrir que não chegará àquela reunião tão importante. A situação emocional e até física a que este fato impõe a muitos que lá estão é mesmo muito dura. Mas não é sinal do fim dos tempos. É sinal apenas de que os tempos seguem, seguem mudando, o planeta é vivo e nós vivemos nele. Não sobre ele.
Há algumas semanas, quando tivemos um período de chuvas terríveis por aqui, escutamos que era a maior chuva dos últimos 70 anos! Enquanto suspirávamos todos assustados com o fim do mundo, meu primo com o raciocínio mais matemático que o meu simplesmente pontuou: isto quer dizer que há setenta anos choveu mais que agora.
A diferença não está na natureza mais severa. Está em nosso solo mais impermeabilizado por uma urbanização mal feita, em uma quantidade de voos por hora provavelmente maior do que a quantidade de voos por mês 50 atrás anos e uma sensação de urgência por temas pouco urgentes. Está na nossa ilusão crescente de quê somos soberanos como espécie. Tentemos aprender a respeitar nossa posição de célula neste mundo ao invés de nossa ilusão de sermos o cérebro deste planeta. Precisamos aprender a respeitar o planeta pela nossa sobrevivência, não a dele. Somos nós que pagamos pelo nosso desrespeito, assim como o passarinho ao brigar com a calota do carro. Acalmemos nossas almas e apreciemos a força do planeta, pois ele está apenas vivo, ainda que agitado.
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