Publicado: Terça-feira, 14 de julho de 2009
Louis Amirat, um francês em Itu
Uma cidade como Itu, formada pela riqueza do açúcar e ao mesmo tempo pelo isolamento da Capitania de São Paulo, hoje se torna interessante por preservar seu desenho urbano do início do século XVIII.
É como as cidades mineiras, por suas ruas estreitas, aconchegantes e casario preservado, mas diferencia-se por seu traçado, pois aqui as ruas sinuosas dão lugar a outras, paralelas, cortadas por becos perpendiculares, entre os quais o mais interessante é o antigo beco do inferno, o Becão (rua XV de Novembro).
A cada esquina um largo e nele uma igreja. As construções nela existentes são retratos de uma sociedade que esbanjava opulência, sobrados suntuosos, edifícios públicos e igrejas, um sem número delas, todas ricas, repletas do dourado que enriquece o barroco.
Essa concepção de crescimento planejado da cidade tornou-se constante em Itu durante séculos. O que conhecemos hoje, da cidade oitocentista, certamente é bastante diferente daquele traço original; a maioria de nossos monumentos arquitetônicos foi recriado, como o foi também o gosto do paulista de Itu.
Ao longo da segunda metade do século XIX, muitas mudanças ocorrem na economia brasileira e a partir delas também há reflexos na política e na cultura da elite, modificando diversos aspectos da cidade. Esse espírito ituano de transformações, de abertura para novas tendências culturais despertou interesse, em um arquiteto francês, que, na década de 1880 já estava vivendo em Itu, como artífice de todo um processo de transformação, Louis Marins Amirat.
O arquiteto e mestre construtor Louis Marins Amirat. Nasceu na França em 1845. Após estudar Arquitetura na Universidade Sorbonne, em Paris, mudou-se para o Brasil, radicando-se no Sul do país. Ali casou-se com Guilhermina Bonn, presbiteriana de família alemã. Transferiram-se para Itu. Aqui encontrou uma cidade caipira, naquilo que significa o modo de ser do paulista, mas rica e interessante, com dois colégios dirigidos por europeus (Colégio São Luís, dos jesuítas italianos e o Colégio Patrocínio, das Irmãs de São José de Chambéry - francesas).
Não só a influência dos religiosos, mas o desejo de toda a sociedade ituana em aproximar-se do mundo “civilizado” europeu fez com que Amirat desenvolvesse seu trabalho como mestre construtor, já que seus diplomas franceses não tinham reconhecimento no Brasil de então.
Encontrou uma cidade repleta de igrejas inspiradas no barroco ibérico, ricamente adornadas e decoradas internamente, com fachadas bastante despojadas, despretensiosas; ruas e praças sem qualquer calçamento, um aspecto absolutamente diverso do europeu. Suas velhas casas, algumas com mais de cem anos, eram construídas com a taipa de pilão e o pau-a-pique, que misturavam a técnica portuguesa ao saber fazer dos indígenas.
Parcela da elite loca, sequiosa por mudanças radicais, cansou-se da taipa, das velhas e grossas paredes de barro. Muitos filhos de fazendeiros iam estudar na Europa e traziam de lá o desejo de europeizar e “civilizar” Itu. Vivia-se em todo o mundo, nesse período, uma retomada dos valores da Antiguidade Clássica, o que se deu não só no pensamento, mas na cultura da maneira geral.
A concepção de república, como forma de governo que dá poder à classe dos ‘cidadãos’, outrora ‘homens bons’ vai mudar a cabeça das pessoas. Com a república também vem a concepção de monumento urbanos para a cidade, como na antiga Polis. A cidade de Itu parte então para sua reconstrução, transformando seus edifícios públicos e igrejas em monumentos imponentes, altivos, soberbos, como se sua estrutura engrandecesse a nobre elite local e criasse em toda a comunidade um orgulho em viver numa cidade moderna, planejada, ‘civilizada’, com os pés no século XX.
Louis Amirat teve um papel fundamental em todo esse processo, não só por trazer da França uma técnica construtiva diferenciada, utilizando definitivamente o tijolo nas construções, mas, sobretudo, por incorporar nos projetos de sua direção a monumentalidade européia e o requinte de acabamento às fachadas ituanas.
Seu trabalho mais importante está nas fachadas das igrejas Matriz, do Bom Jesus e Patrocínio, todas com interferência de Amirat, seja com projeto de Paula Souza e Ramos de Azevedo ou mesmo seu. Encontramos ali traços nítidos do ecletismo, envolvendo elementos de diversas correntes artísticas anteriores, em uma fusão significativa que imprime monumentalidade aos edifícios.
O interior do Santuário Nacional do Sagrado Coração de Jesus é outra obra importante do arquiteto francês, influenciada pelo renascimento italiano, desejado pelo Padre Bartolomeu Taddei.
Viúvo desde 1890, a partir de 1898, Amirat passa a viver com seus filhos Maria Luiza, Rosinete, Maria Helena, Marcelen e Pedro, na casa que construiu na antiga rua do Comércio, hoje Capitão Fleming, número 53, tendo ao lado seu escritório no número 35.
Faleceu em Itu em 16 de maio de 1918 legando à cidade toda uma importante obra que transformou Itu e que ainda hoje nos faz refletir sobre seu entorno, sua conservação e transformação.
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