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Publicado: Domingo, 5 de outubro de 2008

Maledicência

Maledicência

Não. Não negue. Mesmo que essa não seja a maior de suas fraquezas ou aquele defeito que o marca mais, admita que vez por outra também se deixa envolver por algum diálogo ou rodinha de prosa em que se fala mal dos outros.

Essa troca de impressões sobre amigos e inimigos, ausentes, tanto corre por conta de banalidades como resvala também pela difamação barata e covarde. Bem verdade que a difamação vai capitulada na lei penal, mas se trata de ofensa pessoal e legal de difícil comprovação.

 

A maledicência – um mal em si – tem suas agravantes. A começar pelo fato de que tal conversa, saborosa e flamante, repousa quase sempre no diz-que-diz ou no ouvi-dizer. O clássico “falaram”. A ausência de fundamento para os boatos não preocupa ninguém da roda e ai do foco das referências se for desafeto de alguém dali.

 

No rol infinito das agravantes da maledicência, existe aquela que o chiste popular ilustra bem: quem conta um conto, acrescenta um ponto. Uma desavença de duas pessoas, que no fundo não tenha passado de uma discussão sem maiores conseqüências, no passar de boca a boca vai se transformar depois em ferimentos e prisões. Até os personagens são trocados ou confundidos com gente que nunca participou ou nem sabe do ocorrido. Isso quando não se chega ao cúmulo de matar pessoas bem vivas e saudáveis.

 

Se é verdade que pouquíssimos estariam a salvo de serem incluídos como incapazes de maldizer o semelhante, entre a grande maioria se destacam alguns especialistas na prática do insidioso leva-e-traz. É encontrá-los e antes de um bom dia ou boa tarde ou o de um oi mais íntimo, lá vêm eles ou elas a desfiar o rosário das novidades. Diminuem o tom de voz, chegam mais perto e alguns inclusive tapam com a mão a própria boca ou vão ao exagero de com a mão em concha falar junto ao ouvido do interlocutor.

 

Tem então o outro lado a considerar. Quantos e quantos caem na boca pequena dos maldosos sem saber. Pousam de tontos e de palhaços na sociedade e, o mais grave de tudo isso, sofrem o ridículo de conviver com amigos e inimigos, nos empregos, nos clubes e por incrível que pareça, também nas próprias comunidades religiosas. Nestas, um local e ambiente de convivência sadia, seria legítimo contar com as melhores condições possíveis de crescimento espiritual. Nunca a da mais remota possibilidade de justamente ali se sentir injustiçado e vir a sofrer. Ainda mais de dor moral, que punge fortemente.

 

Infelizmente, pela facilidade como se pode destilar o veneno da maledicência, muitas reputações e conceitos são simplesmente jogados no lixo.

 

Da parte dos ofendidos, que praticamente nunca ficam sabendo de que sua vida é vilipendiada, quando essa ignomínia lhes chega ao conhecimento, pouco ou nada podem fazer. Se dotados de boa formação, só lhes resta o consolo de se saberem inocentes e de que por pior que tenha sido a maledicência, perante Deus estão bem. Uma eventual tomada de satisfação, no geral, pode agravar a situação. Além do que seria valorizar demais quem não merece. Mais sábia e oportuna, sem dúvida, a nobre decisão de segurar nas mãos de Deus e rezar pelos detratores. Aceitar esse sofrimento originado na pobreza alheia para enriquece-lo na forma de oferenda a Deus, como um mínimo de reparo do muito das próprias faltas e pecados da vida.

 

Difícil aceitar esta verdade, mas muito melhor ser contado entre os injustamente ofendidos do que ser um dos que dilapidam sem escrúpulo.

 

Valeria, pois, a esta altura, um bom, sincero e corajoso exame de consciência, para todos se situarem quanto a esse problema, tão difundido quanto impune.

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