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Publicado: Quarta-feira, 4 de julho de 2018

Não corra, não mate, não morra

Sento-me à secretária e nesta mesa entupida de papéis e recados, ponho-me a pensar. O que de bom trazer aos leitores, desta vez, assim tão de improviso.

Aliás, em termos de crônicas, no rigor da palavra, sói mesmo aos seus autores, justamente a expressão do inesperado. Quase sempre. Brota na mente e na hora.

Ponho-me de costas para a rua, daqui do primeiro andar que amplia sempre o horizonte e assim de onde diviso tudo do alto. Por exceção, desta vez, não tenciono ser influenciado pela paisagem tão longe e larga, de imagem afastada, a do bairro próximo aqui do centro.

O que fiz hoje, na parte da manhã e com o detalhe de que agora me assento, a pensar, neste dia que acena para o fim da tarde?

Cronista tem dessas. De dar as mãos ao hipotético leitor e levá-lo, muitas e muitas vezes sem direção prévia nem destino.

Mas, se o caro amigo ou a senhora chegaram até aqui, não se furtem a me dar as mãos. Vamos perambular.

Para não caminhar assim também tão a esmo, podemos nos localizar.

As horas medeiam lá pelas quatro, quatro e meia da tarde. Mais ou menos, porque obviamente o relógio não o trago neste momento nem tenho outro ao alcance da minha vista. Não fui então à janela como não vou agora.

Somente para saberem vocês que toda esta lenga-lenga, seja atribuída a que me tardo em ir ao banho. Pura preguiça. Ah, que é isso? Desminto, preguiça não. Quando muito um certo relaxar do corpo, porém com a mente ativa e ativada, do que faz prova o próprio encaminhamento do texto.

E parabéns pela perseverança. Se alguém saiu antes, penso que leve desvantagem, até porque demonstra sucumbir à correria, pressa e compromissos que tais. Só lhes faltam as asas para abreviar espaços.

São tão brutais as imposições vigentes, que até as crianças não percebem que se lhes furta a fase da plena inocência e aqueles entretenimentos do passado. Os pequeninos eram praticamente livres e criativos e usufruíam daquilo que seja a idade da infância propriamente dita. Quando foi, amáveis leitores, que vocês viram uma figura de monstro através de um mamão oco sobre o muro, com vela acesa dentro a mostrar olhos e boca do fantasma?

Pequerruchos já têm mochila e pasta estufadas de pertences. Cuida-se de ensinar-lhes  rudimentos do idioma inglês, até com mais afinco do que para com a língua pátria. É moderno. É bonito. É de se admirar sua inteligência e saber.

De repente me interpelam, aqui em casa, se vou ao banho já ou agora. É que você está aí parado, aduzem, sem fazer nada.

Habituado a esses lembretes – ou advertências – compreendo que aos daqui de casa lhes pareça que esteja à toa.

E decido. Vou ao banho.

Isso mesmo.

Faço lembrar, porém, outra vez: não corra, não mate, não morra.

Grato por você, em especial, que esteve comigo até aqui.

Conquanto original, data este enfoque de 5.5.2018.

 

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