O brasileiro, de joelhos

Às vezes dá a impressão de que embora a gente imagine manter o controle da vida à nossa volta, no fundo mesmo, sem que se dê conta do fenômeno, cada um acaba sendo levado para lugares e ações quase estranhos.

Para dizer melhor, se a cada momento houvesse tempo de parar e pensar, muito provavelmente seriam outros os caminhos e os fins pontilhados.

Outro acasalamento de planos e intenções, este bem compreensível e natural, é aquele pouco que se consegue reter, muito pouco, no atendimento direto e objetivo de interesses particulares e pessoais. Mesmo assim, restrito. Até assuntos de família escapam, a ter como exemplo simples a dificuldade de se acompanhar os passos dos filhos.

É tão verdadeira e avassaladora a onda que envolve e engolfa as pessoas em geral, que anomalias sem conta acabam despercebidas. Daí para frente, absurdos ganham a feição de rotina. Quase de normalidade.

Um exemplo simples, simplório, comezinho: a incapacidade de se exercer controle sobre o tráfego das motocicletas. Tormento dos condutores de outros veículos, eis que elas surgem do nada e em velocidade não se diga somente excessiva, mas abusada e impune.

Outra aventura para a qual o imobilismo das populações só a incentiva, é a do montante da corrupção na atividade política. Acontecem lá no alto CPIs que nunca prendem ninguém. Para citar apenas de memória e sem pesquisa: ainda o “ mensalão “, até agora não definidos os culpados; a farra no DNIT: os arranjos para poupar alguns nomes no Ministério da Agricultura e especificamente na Conab; os milhões surripiados no governo do Distrito Federal; verbas pagas e hospitais não construídos no Maranhão; mazelas no Ministério das Cidades e do Turismo. A cada dia aflora um novo arrombamento dos cofres públicos. Sobre desmandos também na esfera de tantos governos municipais e dos Estados, quem deles não sabe?

Esta conversa pode estar dando a impressão de que se busca uma crítica em cima dos senhores políticos. Absolutamente. Seria tempo perdido. Clamar no deserto.

A ordem das coisas no Brasil vige através das conveniências. Mesmo sob a prova evidente e inequívoca das fotos de entrega e recebimento de dinheiro, a Justiça é branda. Eles escapam sempre. E voltam e se repetem.

O destino das presentes considerações, pelo contrário, são os próprios cidadãos brasileiros, desinteressados e incompetentes para se organizar e por cobro ao atrevimento e desfaçatez daqueles que, pelo contrário, deveriam cuidar dos interesses do país e de seus habitantes. Não se prega a desordem nem a mudança de regime governamental.  Aliás, de certo modo, até caberia a mudança de regime, o da pseudo democracia de proveito de poucos para a democracia plena e verdadeira da igualdade de direitos e obrigações.

Cumpriria uma longa jornada de aglutinação de ideias e movimentos, a tomar corpo gradativamente. Modelo natural seria o expediente do voto, cuja força e eficácia o povo ainda não entendeu. Descrente, vota por obrigação. Numa fase em que a fraude eleitoral se torna menos viável, o Brasil desponta como exemplo na tecnologia da eleição eletrônica.

Aí, exatamente, é que se volta ao fulcro de toda a questão. A velocidade dos fatos, a urgência, os mil programas e compromissos, além de inúmeras e infindáveis causas, imobilizam as pessoas para iniciativas conjuntas e organizadas. Seria preciso nascer uma célula, pequena que fosse, para gradativamente ganhar força. A história demonstra séculos afora que nações e povos galgaram mudanças a partir de pequenos grupos.

Esvoaçou pela cidade e sumiu com a mesma rapidez, uma onda pouco difundida, quase aos cochichos, de se escrever aquela que seria a chamada Carta de Itu, em 2010. Ocorreria, falou-se, na oportuna data de 18 de abril.  Consta que o intento teria nascido morto, entre outros possíveis motivos, justamente porque os planos incluiriam a vinda a Itu de conhecido político. Perderia então toda originalidade e pureza de intenções.

Uma tomada de posição, dessa natureza, não poderia nascer eivada de facciosismo. Um pronunciamento altivo, sincero e patriótico, tivesse dado certo, além de tudo, recolocaria Itu no mapa do país na altura que sua história faz por merecer. E com muito mais resultados do que difundir um inócuo e ingênuo gigantismo com figuras de tamanho desproporcional.

Itu tem mais a oferecer.

Célula, ou células inovadoras.

Um sonho.

O brasileiro, de fato, está impassível e inerte, literalmente de joelhos.

No máximo, esbravejam, mas somente nas rodinhas sociais e nas esquinas.

Já que genuflexos, aproveitem todos, ao menos para rezar.