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Publicado: Sábado, 28 de março de 2015

O mesmo céu

O mesmo céu
Escultura "Cubo de martelos", de Washington Silveira

A molecada fazia a festa. "Olha o vovô aí, galera!", gritavam os primeiros para aqueles lá no fundo do terrão. O grande terreno, baldio, era pura poesia naqueles invernos cheios de pipas no ar. O homem, de pele cansada e sorriso rejuvenescedor, vinha caminhando devagar, olhando para as nuvens e arrastando o papagaio pelo estirante. A rabiola comprida ia riscando o chão e encantando os novatos da área. Embaixo do braço, uma lata de óleo engordada com mais de duas mil jardas de linha chilena branquinha. Ele chupava o dedo, apontava para o céu a fim de identificar a direção do vento e pedia para alguém levar a armação de bambu lá do outro lado. Todos paravam para vê-lo remando a linha com força e depois soltando suave enquanto o quadrado subia. Acabavam as férias escolares e o homem sumia. Certa vez, um garoto curioso lhe encurralou: "Por quê mesmo depois de grande o senhor continua empinando pipa?". Respondeu: "Quando olho para ela balançando lá em cima, é o mesmo céu da minha infância".

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