O reino
Mesmo na masmorra era impossível não ouvir a canção de guerra do inimigo ainda se alegrando na outra margem, ou então sentir a terra tremer com a marcha do exército. O reino, já sem filhos há muitos anos e definhando dentro do castelo, tinha apenas o livro da vida para proteger. Seus campos já tinham perdido o verde; seu general, deserdado; seu conselheiro, enlouquecido. A rainha, única sobrevivente, fez um discurso inflado e, ao terminar, ordenou a formação de guerra dos seus soldados. Então, um jovem gritou escondido no meio do pequeno ajuntamento: "Não somos nem uma centena de homens... Lá fora eles são milhares e bem alimentados. Poupe-nos, alteza, e entregue de uma vez o livro da vida!". Houve um silêncio que foi quebrado pelas lágrimas da soberana: "Não guerrearemos para proteger nosso tesouro. Já está perdido. Lutaremos para não vermos, mais tarde, nossa cara de covarde espelhada na água todas as vezes que tivermos sede. Lutaremos para sermos absolvidos com a morte". E partiram.