O Sofrimento Humano e a Existência de Deus
Entre tantos temas interessantes, resolvi tratar do sofrimento humano no meu trabalho de conclusão do curso de Teologia. Mas não está suficientemente claro que sofrer faz parte da vida e acompanha todos os seres viventes?
Não são poucas as pessoas que se alienam propositalmente desta verdade de que sofrer é intrínseco ao viver. O ser humano tem se especializado em contornar tudo aquilo que o incomoda, inclusive a reflexão sobre quais motivos o levam a sofrer realmente e qual o verdadeiro caminho para suportar as dores da nossa existência.
Precisamos falar do sofrimento porque muitos se iludem tentando evitá-lo a qualquer custo. Na modernidade vende-se uma falsa ideia de que é possível ser feliz o tempo todo, de que sofrer possa ser opcional, de que através de alguns produtos ou procedimentos o ser humano seria capaz de eliminar para sempre qualquer tipo de sofrer.
No primeiro capítulo, intitulado "O Sofrimento Humano" vemos o mistério do Mal presente no mundo e a questão do sofrimento na contemporaneidade. Analisamos também a grande dúvida antropológica: por qual motivo sofremos? A seguir mergulhamos no inconformismo do ser humano diante do sofrimento e da sua luta na tentativa de vencê-lo de alguma forma. Finalmente, encaramos a triste realidade das pessoas que, por causa dos sofrimentos que enfrentam, perdem a fé na beleza da vida e na existência do Criador, escondendo-se num ateísmo que não alivia em nada os seus dramas existenciais.
No segundo capítulo, chamado "O Mistério Pascal como resposta divina às misérias humanas", vemos qual é a atitude de Deus diante do sofrimento dos seres humanos. Inicialmente parece que o Criador fica em silêncio, alheio às dores de suas criaturas. Porém, verificamos que na verdade Deus é solidário ao nosso sofrimento. Através da Encarnação de Jesus Cristo, Deus toma para si as nossas dores e se faz um conosco no mistério do sofrer. Após sua dolorosa e sofrida Paixão, percebemos que o mistério pascal é a resposta divina às misérias humanas, uma vez que a Ressurreição de Cristo, base da nossa fé, é para nós uma fonte de esperança na superação de qualquer sofrimento.
No terceiro capítulo, nomeado "A Igreja não é indiferente ao sofrimento humano", vemos algumas respostas e opções sugeridas pela Igreja na luta do gênero humano contra o sofrimento. Ao longo dos séculos ela indicou ao mundo diversos caminhos para superar as variadas e dramáticas situações humanas. Percebemos que a fé é um instrumento primordial para suportar e dar sentido aos sofrimentos. E ainda como a Misericórdia, presente no serviço pastoral em favor dos que sofrem, são elementos que nos fazem sair de nós mesmos para aliviar os sofrimentos alheios, tornando-nos assim menos infelizes e mais realizados.
Evitar o sofrimento é impossível. Quem tem medo de sofrer já sofre simplesmente por esse motivo. Tapar o sol com a peneira, como se diz popularmente, não é portanto a solução para os nossos males. Resta aos seres humanos a alternativa realista de encarar o problema. Não há opção melhor para experimentar o mistério do sofrimento do que mergulhar nele à luz da fé em Jesus Cristo.
Se não podemos acabar com o mal e com o sofrimento no mundo, podemos ao menos fazer deles alavancas que nos impulsionam para o Reino. Somos chamados a experimentar e a testemunhar as maravilhas de Deus, tanto no amor quanto na dor. Jesus de Nazaré é a nossa referência. Ele ensinou o ser humano a fazer o bem com o sofrimento e, ao mesmo tempo, a fazer o bem a quem sofre. E, sob este duplo aspecto, o Mestre revelou de forma cabal o sentido do sofrimento.
Trata-se de uma alternativa claramente dolorosa, mas frutuosa. O grande segredo para superarmos o nosso sofrimento particular é sermos solidários com os outros do mesmo modo que Deus se faz solidário conosco, para então nos lançarmos corajosamente ao serviço de outros tantos irmãos e irmãs que sofrem. À medida que deixamos o nosso sofrimento de lado e ajudamos a aliviar as dores do nosso próximo, encontramos juntos um consolo divino que nos alegra e vivifica.
Entre tantos modelos de seguimento a Cristo no sofrimento, escolhemos apresentar duas mulheres da contemporaneidade. Uma delas já é reconhecida e aclamada no mundo todo. Trata-se de Santa Teresa de Calcutá, uma mulher frágil e simples que, com sua determinação em servir os seres humanos que sofrem, iniciou uma das maiores instituições de caridade do mundo, deixando um legado que decerto continuará inspirando homens e mulheres de todo o planeta.
A outra mulher, ainda nem tão conhecida, é Maria de Lourdes Guarda, da Diocese de Jundiaí (SP). Professora acometida de grave enfermidade na juventude, passou décadas atuando num verdadeiro discipulado, mesmo impossibilitada de sair da cama. Do seu leito no Hospital Matarazzo, na capital paulista, acolhia e consolava outras pessoas tão sofredoras quanto ela e foi a propagadora maior, em solo brasileiro, da Fraternidade Cristã de Doentes e Deficientes, um movimento internacional fundado na França. Já nos idos de mil novecentos e oitenta, Maria de Lourdes clamava pela melhoria nas condições da saúde pública, participando até de piquetes e mobilizações às quais fazia questão de comparecer, mesmo tendo de ser levada de maca ao encontro do povo sofredor.
Contemplar o mistério da Paixão sem perder de vista a realidade da Ressurreição deve nos impulsionar. Ao contrário do medo, que nos paralisa e desespera, a alegria que vem do Evangelho e da solidariedade de Deus para conosco precisa nos mover na direção dos tantos incrédulos, infelizes e desesperançados da modernidade.
O mal no mundo continuará atormentando a humanidade, e o tema do sofrimento certamente permanecerá sendo um dos mais inquietantes. Ao ser humano cabe aceitar o desafio diário de tomar a cada dia a própria cruz (cf. Lc 9,23), sabendo que ela é o caminho de salvação indicado por Cristo àqueles que decidiram segui-lo. Ao longo desse caminho seremos também cirineus uns dos outros (cf. Mt 27,33) e assim, pela Graça divina e animados pelo Espírito do Ressuscitado, chegaremos um dia à terra onde corre leite e mel (cf. Ex 33,3), quando o Pai, de uma vez por todas, há de enxugar todas as nossas lágrimas (cf. Ap 21,4).
Amém.