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Publicado: Quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O Velho Mestre

Crédito: Álbum de Família O Velho Mestre
Quiçá um dia consigamos compreender...

Não estava em Itu quando do falecimento do Professor João Bispo, mas ele continuará uma figura viva em meu coração e em minha alma. Sempre tive muita alegria em encontrá-lo em suas caminhadas pelo Centro de Itu, ou na Igreja Bom Jesus, onde gostava de ir, para "refletir sobre a vida", dizia ele.  Foram quatro diretores, com nome João, que fizeram nome nesta cidade. Tive a honra de conviver com todos eles, em diferentes momentos. João Bispo(Regente), João Navarro(Pinheiro Júnior), Joãozinho(Nardy Filho) e João Grigolon (Cesário Mota). Homens de imenso valor, de profundo censo de ética e grande bondade. Professores por excelência.  

Um dia o Professor João Bispo encontrou-me na rua e convidou-me para ver "uma coisa" no quintal de sua casa.  Era um ninho de rolinha, bem ao lado da porta. "Ela sempre faz seu ninho aqui", disse-me ele, "há anos". A ave encontrava segurança e paz naquela casa, justamente o que encontrávamos na convivência com o Professor João dos Santos Bispo.

Então, deixo aqui, novamente, um texto publicado há alguns anos, onde lembrava a figura deste homem digno e bondoso.

De um autor desconhecido, este poema dedicado à nobreza do professor, e de todos os profissionais que abraçam seu trabalho com amor, fazendo da vida uma profissão de fé e de esperança, era por mim declamado, e encenado, em minha infância, nas festas do querido Regente Feijó, em Itu, no Estado de São Paulo. 

Eu, então, ficava muito orgulhoso. Hoje, homem feito, além de muito agradecido a Deus pela oportunidade, continuo muito orgulhoso por ter feito parte de uma família tão nobre, a Família Regente Feijó, que tem como símbolo um dos mais dignos homens que conheci, o Professor João dos Santos Bispo.

 
O Velho Mestre
 
 
Andava muito doente o velho professor.

Por isso ele já não tinha, agora,

O mesmo ardor que outrora o possuía,

E o animava dantes.

 

Às vezes, quando em aula,

- Havia mesmo instantes!

Em que inclinava a fronte,

Aquela fronte austera e cansada,

Onde já desabrochava a flor da primavera

E cochilava um pouco, involuntariamente.

O velho professor andava muito doente.

 

Mas, era tamanho o bem que nos queria

Que jamais quis pedir aposentadoria.

Era o primeiro a aparecer na escola

Com suas joviais maneiras tão simpáticas

Não obstante sentir umas dores reumáticas

Que o faziam sofrer muito, ultimamente.

O velho professor andava muito doente.

 

Um dia chegou mais tarde, alguns instantes.

Trazia, nas feições sérias de sofrimento,

A palidez do rosto.

Seus olhos encovados,

Denunciavam seus pesares ignorados

E, como que pra’ tornar a dor mais manifesta,

Cravara-lhe fundo uma ruga na testa,

Franzia-lhe a cara  uma expressão de horror

Andava muito doente o velho professor.

 

A aula começou,

Mas pouco antes das onze,

O velho mestre, o bom trabalhador de bronze,

Que já perto de trinta anos, ou mais, havia

Que gigantesco herói, lutava, dia a dia

Para a glória da Pátria e para o bem  da infância

Dando combate ao vício e à ignorância,

Sentindo uma dor nos agudos abrolhos

Curvou as nobres cãs, cerrou de leve os olhos.

 

Lá fora surgia o sol, a manhã era calma, risonha.

A natureza abria sua alma repleta de alegria,

E cheia de esplendores...

Pela janela entrava o hálito das flores,

Naquela atmosfera azul, lavada fina.

Ressoava baixinho, assim como em surdina,

Um canto celestial, harmonioso e suave,

Anjos tocando em suas harpas alguma canção de ave.

 

Nisso, ergue-se um aluno, um pândego, um peralta,

Fabricou de jornal um chapéu de copa alta

E... bem devagarinho,

(Que idéia travessa!)

Chegou-se junto ao professor e... zàs!

Enfiou-lhe o chapéu na cabeça.

O mestre nem abriu o sonolento olhar.

 

Ante aquele ato vil,

De traição!

De improviso,

Rebentou, uníssono, pela sala

Estardalhante riso.

 

De súbito, surgiu o diretor.

Demudou-lhe os gestos,

Estremeceu lhe a fala, transtornado.

Transformando a mansidão de bois

Em fúria de leão, nos perguntou:

Quem foi?

Quem foi este vilão que fez tal brejeirice

Sem respeito algum às cãs desta velhice?

 

Ninguém respondeu,

Ninguém denunciou da brincadeira o autor.

Silencioso, sereno, como um dom

Dormia o velho professor.

 

O diretor, então,

Com doçura, chegou-se junto à mesa.

Via-se em seu rosto o incômodo, a surpresa,

De que o sono do mestre, assim se prolongasse.

 

Curvou-se meigamente e levantou-lhe a face....

Mas, tremendo, recuou.

Aterrorizado!

Aniquilado!

Mudo!

Absorto!

O velho professor...

Estava morto!

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