Olimpíadas 2016
O cronista, sob certo aspecto, vive a curiosa situação, a de ser ao mesmo tempo livre e preso ao escrever.
Tão livre que, como tantas vezes já se comentou, até o fato simples da queda de um lápis que rola da mesa para o chão, motiva algum assunto.
Talvez o cidadão pela idade e pela falta de exercícios, quase não possa se curvar para erguer, como também se perceba que a mesa é pequena demais ou ainda lamentar a chateação de ter que apontar o lápis, justamente quando não se encontra o apontador porque as crianças o levaram e deixaram, como sempre, não se sabe onde.
Ao inverso das amplas chances de abordagem, acontece também, noutras vezes, de não se conseguir dar o primeiro passo, como se amarrado estivesse, na busca de um enfoque que realmente interesse ao público.
Fosse partir desse azo, o do interesse público, comentário em pauta nestes dias é fora de dúvida o feito extraordinário de que o Brasil consegue trazer para cá a realização das Olimpíadas de 2016.
Evento sim extraordinário, com o acréscimo de que pela vez primeira vai ocorrer na América do Sul.
E logo o devaneio tira você um pouco do assunto e faz lembrar da imagem dos circunspectos representantes de todos os países concorrentes, seus principais mandatários e toda comissão de autoridades. Sessão solene, todos engravatados, suspense. Tivesse outro país sido escolhido, certamente se abririam, mas em discreto júbilo, cumprimentando-se entre si, sem maiores alardes.
Justamente.
Aí, na hora do anúncio do Rio de Janeiro, o mundo viu exposta a alma de um povo diferente. Verdadeira algazarra, no bom sentido. Todos deixaram suas poltronas e se misturaram na mais explosiva das alegrias. A formalidade, a etiqueta, o cerimonial, completamente superados pelo uníssono de uma viva e legítima vibração.
Na apresentação do Rio e na excelente peça produzida nas filmagens do Meirelles, mostraram-se todas as inigualáveis maravilhas naturais e edificadas, da cidade única, que é o Rio. Não se descuidou entanto de mostrar o jeito de ser solto e alegre do brasileiro. Tudo se juntou e terá sido difícil – ou foi fácil por se falar noutros termos – não proceder doutro modo senão escolher o Brasil.
A vibração, justa e justificada, ao depois, precisa se assentar à mesa da ponderação e cair na realidade.
Há toda uma ingente tarefa a ser cumprida.
Coisa típica de brasileiros também, que, já no dia seguinte, lá mesmo em Copenhague – nem tinham retornado – os membros do Comitê Olímpico e os do Ministério do Esporte chegavam a um pequeno desentendimento, o de qual deles comandaria as ações.
A hora portanto se presta a que o Brasil, nesse momento de tão importante conquista, visse também uma data símbolo, a inaugurar uma nova mentalidade nacional (que sonho, não?) de seriedade e respeito mútuo, com a proscrição definitiva do “jeitinho brasileiro” e da filosofia malsã de ter que “levar vantagem” sempre, de uns sobre os outros.
Aquele país sério, históricamente proclamado como “não sério” pela sentença inexorável de Charles De Gaulle. Extirpar essa mancha. De uma vez por todas.
Mesmo no dia a dia, vêem-se pessoas a não querer a nota fiscal paulista, temerosas de possível conexão do fisco local com o Imposto de Renda.
Gente também, aqui e ali, que se desprendeu dos oportunos e práticos cartões de crédito com a mesma preocupação, a de serem flagrados pela espetacular diferença entre os encargos e impostos que deveriam recolher à Nação e os valores mínimos com que efetivamente contribuem.
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