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Publicado: Segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Os Suicidas

Quando os pais de Teófilo separaram-se, ele e as irmãs ficaram em Portugal com a mãe e o pai veio para o Brasil.

A mãe de Teófilo era artista. Tinha a vida muito intensa com compromissos de trabalho e sociais. Tinha pouco tempo para os filhos, mas compensava fazendo-lhes todas as vontades e dando-lhes ampla liberdade.

Apesar de separados judicial e geograficamente, o casal brigava muito.

Ela achava que ele não pagava pela pensão alimentícia dos filhos tanto quanto devia pagar, que sonegava rendimentos.

Ele alegava que estava pagando o que tinham direito e que não podia dar mais porque tinha outra família para sustentar, mulher, enteada, e sogro.

Quando Téo terminou o curso médio, ela exigiu do ex-marido que o assumisse e se responsabilizasse pelo seu estudo superior.

O pai respondeu que podia mandar o garoto que ele cuidaria dele.

A mãe explicou ao Téo que seria melhor para ele viver com o pai. Que os rapazes precisam de um pai que os oriente e os proteja.

E o Téo foi despachado para o Brasil.
 
Despachado literalmente, a mãe colocou-o em um avião e ele devia ser entregue, no aeroporto do Rio de Janeiro ao Senhor Joaquim de Barros Mendonça.

Téo pouco se lembrava do pai. Não tinha nenhuma ligação com ele e a perspectiva de morar em um país estranho com um pai com quem não tinha qualquer laço afetivo o assustava e aborrecia.

- Tomara que ele não esteja me esperando, pensou.

Que será que farão comigo se isso acontecer?

Será que me devolvem com um carimbo: "Não encontrado o destinatário?".
 
Mas ele estava lá, sim, e o levou para sua casa onde morava com a mulher, sua filha adolescente e seu velho pai.

Norma, a madrasta, recebeu-o polidamente, apesar de ser mais do que evidente que não estava gostando de hospedá-lo.
 
A menina não lhe deu a mínima atenção (a mãe lhe dissera para manter-se afastada do rapaz que foi criado solto nas ruas de Lisboa e devia ter todos os maus costumes).

E começou para Teófilo uma vida de muita disciplina a que ele não estava acostumado.

A madrasta não era má, mas era exigente com ordem do quarto e o horário rigoroso para tudo.
 
Na casa da mãe, ele e as irmãs tinham liberdade absoluta. Faziam o que queriam, na hora que desejavam sem dar satisfação a ninguém. A mãe passava dias fora, umas vezes abarrotava a geladeira, outras, deixava-os sem nada para comer, mas eles sempre tinham dinheiro, iam para a rua e comiam o que queriam.

Estavam matriculados no melhor colégio de Lisboa, mas a mãe não se incomodava em saber se assistiam às aulas, se estudavam, se estavam aprendendo.

O pai matriculou-o em um bom colégio, mas ele, embora estivesse mais adiantado do que seus colegas em algumas matérias, estava aquém em outras. Os currículos das duas escolas não coincidiam.

Téo tinha dificuldade de adaptação, também. Embora o idioma fosse o mesmo, seu sotaque era diferente e a nossa linguagem coloquial não lhe era familiar.

Além disso, o pai, sempre temendo que ele fizesse alguma coisa errada, que lhe desse preocupação, proibia-o de freqüentar as reuniões e festinhas promovidas pelos colegas.
 
Logo, ninguém mais o convidava para nada, e ele foi se isolando cada vez mais.

Embora morando em uma linda cidade praiana, nunca ia à praia porque o pai achava que era lá que se reunião todos os malandros da cidade.

À noite a família assistia televisão, mas era sempre a Norma ou sua filha Flora quem escolhia o programa. Ele tinha que assistir o que elas queriam e como nunca era o que gostaria, acabava indo ler um livro no seu quarto.

Sem amigos, sem lazeres, passando os dias numa monotonia sufocante, Teófilo foi ficando triste e deprimido.

A vida se lhe apresentava, sem interesses, nem objetivos e ele começou a querer morrer.

A trágica idéia que surgira aos poucos, titubeante, foi tomando corpo e ele acabou decidido. Ia matar-se!

Pensou muito como faria isso e acabou resolvendo que o melhor seria atirar-se de um penhasco junto a um braço de mar. As águas ali eram profundas e a morte era certa. Já tinha visto a notícias de vários suicídios nesse local.

Surpreendentemente, não tinha medo do "depois". Se fosse o nada, ótimo! Acabava de vez com essa existência sem sentido. Se houvesse outra vida, por certo, não seria pior do que a que vivia agora.

Quando em um fim de semana seu pai viajou com a mulher e a Flora, deixando-o sob os cuidados do Vovô, já velhinho, ele achou que tinha chegado a hora.

Levantou-se muito cedo, antes de clarear o dia, e encaminhou-se para a praia, andando até o local sinistro que escolhera para seu tresloucado ato.

O penhasco íngreme debruçado sobre o mar, as águas escuras, causaram-lhe um arrepio, mas não podia fraquejar agora. Tinha que ir até o fim.

E foi então que ele divisou no alto uma pessoa olhando para o mar. À distância não lhe permitia ver se era um homem ou uma mulher, mas ele tomou-se de horror.
 
Aquela pessoa ia matar-se!

Não havia mais ninguém por perto. Ele tinha que fazer alguma coisa para evitar que isso se consumasse, mas o que? Correu, mesmo sabendo que não conseguiria chegar e escalar o morro a tempo. Gritou, mas sua voz perdeu-se na amplidão.

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