Sabotagem
Gordo e espaçoso, mal deixava visível o amarelo do banco em que estava. Com um gibi nas mãos, vez ou outra levantava o rosto atento para alguma novidade no ônibus. Perito naquele trajeto, sabia exatamente as pessoas que embarcariam em cada ponto, bem como o trecho em que os solavancos maltratavam quem sentava depois do segundo eixo. Mesmo assim, insistia nos últimos assentos a fim de não perder uma boa panorâmica do veículo e aproveitar qualquer evento; O bêbado fingiu que não estava observando a morena gostosa que desce no largo da matriz, mas não deu pra se esconder do seu olhar, por exemplo; A crente, por sua vez, até abrira a bíblia, mas não lia, afinal, analisava tão aficionada a calorosa moça que não notara o livro de ponta cabeça. O coletivo parou e a porta traseira se abriu para uma distinta senhora subir inundando-o com seu perfume doce. Já sem lugar, ele se levantou: "Pode sentar, Sra.". "Obrigado, mas não tenho sessenta anos ainda. Pode sentar o Sr.". E o banco viajou vazio.