Sexo, Sofrimento e Uva
Embora alguns façam julgamentos rasteiros e ignaros sobre mim, sou um conhecedor das coisas da vida. Não se trata de obter diplomas ou elaborar teorias. Trata-se de experimentar as realidades, boas e ruins, da existência humana. E de refletir, nas experiências próprias ou de outrens, sobre a razão de ser disso tudo.
A revolução sexual, tomando por pretexto a "liberdade", resultou na sociedade hedonista, fisiculturística, erotizada e sexualizada que temos hoje. Homens e mulheres apostam tudo na aparência. São escravos dos padrões de beleza e desempenho fartamente propagandeados. Não sabem encarar a realidade do corpo humano, que decai e fica decrépito com o passar das décadas.
Na atualidade quem se preocupa mais com a alma que com o corpo? Quem pensa mais nas realidades invisíveis do que na aparência? Quem gasta mais tempo pensando na vida pós-morte que na futilidades cotidianas? O ser humano imediatista só se contenta com o que passa diante dos seus olhos. Tornou-se insensível àquilo que não consegue enxergar.
Por isso muitas pessoas hoje escolherem como parâmetro de felicidade a questão sexual. Transar bastante e com intensidade seria garantia de uma vida feliz. Ora, se assim fosse, as prostitutas talvez fossem as pessoas mais felizes do universo. Por outro lado, a abstinência sexual e a castidade são para incompetentes, impotentes, traumatizados ou doentes mentais.
O grande erro da mentalidade atual é pensar que o sexo seja a ponte que une intimamente as pessoas. Não há besteira maior. O "sexo casual" e o tal do "poliamor" são provas cabais e contrárias a isso. Qualquer casal em relacionamento longevo sabe que só o sexo não segura uma relação. Cães, porcos e bois também transam, livre e diversamente, mas nem por isso tornam-se realmente íntimos de suas cadelas, porcas e vacas.
Os seres humanos estão unidos entre si pelo sofrimento. Parece triste. E é mesmo. Mas nem tanto, se visto da perspectiva correta. Basta perceber que, quando uma pessoa que amamos sofre demais, nos sentimos mais conectadas a ela do que se tivéssemos ido com a mesma para a cama. O sofrer suplanta o sexo. Pois sofremos com o coração, não com a genitalidade.
Quem deseja sofrer no mundo de hoje? Ninguém, nem eu. Vai contra a nossa razão. Mas isso adianta em quê? Não sofremos do mesmo jeito, por um motivo ou circunstância qualquer? Adianta negar essa realidade da vida? Sofrer faz parte da nossa existência, diria até da nossa essência. Não há desempenho sexual ou número de parceiros que preencha no coração humano os buracos causados por alguns sofrimentos que experimentamos.
Só com o exemplo de Jesus de Nazaré podemos vislumbrar o sofrimento de modo que resulte em alegria plena. Se sofrer faz parte da vida neste mundo, passando pela cruz de Cristo o sofrimento é transformado em alegria na vida eterna. Quem com lágrimas semeia, entre sorrisos colherá.
Percebo, na Bíblia, que Jesus não gasta muito tempo falando aos discípulos sobre questões sexuais. Então seria o Nazareno um liberal quanto à sexualidade? Jamais! O Mestre simplesmente sabia que a felicidade nunca pode ser baseada no sexo, por mais que essa seja uma dimensão importante na vida dos seres humanos.
Gosto de fazer uma comparação com a uva. Se pegarmos um cacho e o deixarmos sobre a mesa, a princípio é bonito e enche a nossa vista. Mas depois ele vai murchando. A uva fica azeda, atrai formigas e nada de bom sai dali. Essa é a realidade de quem baseia a própria vida apenas no sexo. É tudo lindo no começo, mas depois só vem azedume e o vazio.
E a uva sob a ótica do sofrimento? É pisada, tem sua pele rasgada e o interior explodido. É torturada e depois confinada na escuridão de um tonel, onde fica fermentando e sofrendo dias a fio. Mas o que vem depois? Ela se transforma no vinho. Em inúmeras culturas, desde os tempos mais antigos, é a bebida símbolo da alegria e da celebração da vida.
O próprio Cristo, logo em seu primeiro milagre, transformou água em vinho. Teria pensado no sofrimento das uvas ou nos nossos? Não será um sinal para nós de que é possível extrair algo de bom dos nossos sofrimentos? Um alerta contra o azedume da uva solitária e confusa que pretende apenas ser conservada na própria vaidade?
É necessário entender de uma vez por todas: sofrer não é uma escolha, é um fato da vida. Quanto antes soubermos ser felizes mesmo assim, apesar dos pesares dos nossos sofreres, mais perto estaremos da nossa realização pessoal. Viver feliz é possível, mas à custa de alguns sofrimentos sim.
O caminho das pedras, o pulo do gato, o segredo das uvas, é esse. Não se trata do quanto corremos atrás das nossas pequenas e falsas satisfações, mas sim de como transformamos o nosso sofrimento em alegria. E isso, só aprendendo com Jesus Cristo, perito em sofrimento e mais perito ainda em alegria. O sofrimento tem fim, mas a verdadeira alegria em Cristo Ressuscitado não. Uma Feliz e Santa Páscoa a vocês!
Amém.