Publicado: Segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Troca de Favores
Quando Eduardo foi candidato a prefeito de sua cidade, estava imbuído das melhores intenções. Não ia deixar-se corromper. Ia ser um político correto para lavar a fama dos que o tinham antecedido.
Mas, durante a campanha já viu que ia ser difícil perseverar em seus bons propósitos. Mentir, prometer coisas impossíveis fazia parte do chavão de todos os candidatos e ele tinha que fazer a sua campanha se quisesse ganhar a eleição.
E prometeu, aumentar as vagas nas escolas municipais, melhorar o atendimento nos postos de saúde, construir casas populares, criar um sistema miraculoso onde todos fossem bem sucedidos e tornar a sua cidade, num passe de mágica, uma das principais cidades do Estado.
Eduardo foi eleito e começou o seu mandato.
Precisava nomear as pessoas que ocupariam os cargos de confiança, todos da sua família, é claro. Teve até que criar mais alguns cargos porque não podia deixar de empregar a irmã de seu cunhado que ajudou tanto na campanha e o primo Emílio, coitado, que acabara de sair da cadeia e ia ter dificuldade de encontrar trabalho.
Não era muito certo o que fazia, mas era por uma boa causa, justificava-se.
E começaram a aparecer os amigos. Todo mundo, de repente, era seu amigo do peito.
- Você não se lembra de mim? Estudamos juntos no primário.
- Freqüentávamos o mesmo clube.
- Minha avó era amiga da sua.
- Quando você namorava a Mirna, eu namorava a Mirtes, irmã dela.
Eduardo mal se lembrava da Mirna, imagine se ia recordar-se da irmã dela e de quem era o seu namorado.
E todos tinham pedidos para fazer.
Queriam uma vaga que estava sendo disputada por concurso:
- O concurso é muito concorrido, eu não teria chance, você podia me quebrar esse galho, incluir-me entre os aprovados.
Um lugar na escola cujas vagas eram insuficientes para a procura e procedia-se a um sorteio:
- Você não daria um jeitinho de me arranjar uma vaga na escola para meu filho, por fora do sorteio?
- Poderia me perdoar as dívidas atrasadas de IPTU?
- Regularizar uma construção clandestina?
- Doar-me uma nesga de terreno do município que fica junto a minha casa?
E por ai afora. Superestimavam a sua capacidade de resolver problemas e fazer favores.
Tudo por conta de velhas amizades reais ou fictícias.
Eduardo não podia nem queria atender a tantas solicitações, mas também não queria desgostar os munícipes e acabava enrolando, prometendo e não fazendo nada.
Dr. Sampaio, o Delegado de Polícia, procurou pelo Eduardo.
Queria que ele mandasse asfaltar a Estradinha do Barro Liso onde ele possuía uma chacarazinha.
Era um absurdo! A estrada era erma. A única propriedade de algum valor era a chácara do Delegado e havia estradas mais movimentadas que ainda não tinham sido asfaltadas, outras precisavam de recapeamento.
Não! Ele não podia atender o Doutor, mas não disse isso a ele. Pôs panos quentes:
- Vou fazer o possível.
- Mas, será para logo?
- O mais breve possível, Doutor!
O Delegado insistia:
- Você não vai autorizar o serviço?
- Vou! Claro que vou, mas ainda não deu.
- Precisa asfaltar antes das chuvas. Com o tempo chuvoso não há quem consiga transitar por ali. Eu fico impossibilitado de ir a minha chácara. Isto é um absurdo.
- Também acho. O senhor tem toda a razão. Vou providenciar.
Mas não providenciava nada.
Uma noite, já pela madrugada, Eduardo levou um susto. O telefone tocou avisando que seu filho Dudu estava detido na Delegacia de Polícia. Tinha provocado um acidente com o carro.
Chegando lá, Eduardo tomou conhecimento de que pesava sobre ele várias acusações: dirigir sem habilitação, excesso de velocidade, atropelamento, omissão de socorro, fuga...
Eduardo ficou desesperado e telefonou para o Dr. Sampaio.
O delegado atendeu com a voz sonolenta:
- Tem um plantão na delegacia. Ele está apto a resolver.
- Mas doutor, aqui é Eduardo, o Prefeito...
- Oh! Desculpe! Não reconheci sua voz. É claro que vou imediatamente. Fique tranqüilo que nada vai acontecer ao garoto.
E... A propósito... quanto àquele outro assunto...
- Já estamos com tudo agendado. Amanhã mesmo começa o serviço.
E assim, o Dudú se safou de boa e a Estradinha do Barro Liso foi asfaltada.
Troca de favores!
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