Publicado: Domingo, 2 de dezembro de 2007
Vai passar ou repetir de ano? Primeira parte
Chega o fim do ano letivo trazendo a mesma ladainha: será que meu filho vai repetir de ano?
Nesta época, os consultórios de psicoterapia se enchem de famílias que procuram algum tipo de “salvação da lavoura”, pensando que talvez nestes últimos quinze dias de aula, somando-se os esforços de terapia, professora particular, promessas de presentes, ameaças de castigos, novenas ao santo de devoção, poderão evitar o inevitável: a reprovação.
Penso em discutir três aspectos importantes desta situação:
a) A postura dos pais durante todo o ano e seu envolvimento nas tarefas escolares de seus filhos;
b) As manobras utilizadas para premiar os sucessos ou punir os insucessos dos filhos;
c) A real importância da reprovação na história da vida do indivíduo;
Começaremos discutindo a postura dos pais. É muito comum atualmente, que os pais pensem que sua responsabilidade frente à educação de seus filhos se restrinja a pagar uma boa escola, garantindo assim boa formação. Ocorre uma terceirização da educação, e a escola passa a ser responsabilizada pelo sucesso ou insucesso do aluno. Isto é apenas parcialmente verdade, uma vez que boa parte do aprendizado se realiza fora da sala de aula, na vida e no tempo que o aluno dedica estudando em casa.
O que vemos com muita freqüência é que o acompanhamento da família nas tarefas escolares desenvolvidas em casa é muito pequeno. Quando muito, um questionamento do tipo: “Já fez lição?”. De modo geral, não há regras em casa para o tempo destinado à “lição de casa”, nem à maneira como esta tarefa será executada.
Assim, vejo com freqüência crianças e adolescentes com dificuldades escolares, que estudam pouco em casa, e quando o fazem, é de maneira desorganizada, com a TV, e/ou o som, e/ou o computador ligados.
Existe uma confusão entre “ter feito a lição” e “ter aprendido a lição”.
Sei que o tempo de todos é muito curto, e que em muitas famílias os pais trabalham o dia todo. Como cuidar disso então? Uma boa dica é dar uma “olhada”, mesmo que semanal, na qualidade da produção de nossos filhos, checando a maneira como a lição foi feita, a quantidade de erros, dúvidas, borrões, espaços em branco, etc. Esta é uma maneira de acompanhar de perto o desempenho, sem ter que esperar pelo boletim de notas.
Outro ponto a considerar é a maneira como os pais podem ajudar nos deveres de casa. Vejo pais aflitos com o mau desempenho dos filhos, e que, sem tempo, ou paciência ou mesmo jeito para ensinar, acabam por fazer a lição “pelo” filho, que desta forma, não aprende. Uma saída boa é mandar um bilhete para a professora: “Professora, meu filho tentou realizar este exercício e não conseguiu, pois não entendeu a matéria”. Este bilhete ajuda a professora, sinalizando os pontos em que a criança não está muito bem.
Devemos pensar ainda nos motivos pelos quais o desempenho na escola não está muito bom, pois muitos são possíveis de corrigir: falta de óculos, posição em que está sentado na sala de aula, timidez que impede o aluno de fazer perguntas quando não entende, discriminação que a criança possa estar sofrendo por parte dos colegas, e mais raramente, alguns transtornos como a dislexia e o déficit de atenção.
Finalmente, devemos pensar também no tempo real que a criança tem para estudar.
Atendo crianças e adolescentes que acordam às seis horas, correm para a escola, saem de lá na hora do almoço, e logo após, têm a cada dia da semana uma ou duas atividades (inglês, espanhol, computação, natação, vôlei, Kumon, etc), voltando para casa já no final da tarde, quando finalmente vão se preparar para estudar. Pergunto-me qual o rendimento, qual a disposição para neste momento, dedicar-se ao estudo. E também, qual o tempo deste dia que foi dedicado ao ser criança, ao brincar.
Reclamamos muito de nossa falta de tempo e impomos aos nossos filhos um ritmo de vida tão rigoroso quanto o nosso, em nome de um suposto futuro melhor... Devemos refletir se os ganhos são reais e significativos e se para aquela criança especificamente, este ritmo não é excessivo, estressante e uma das causas do mau desempenho escolar.
Continuaremos esta discussão na segunda parte deste texto.
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