Publicado: Quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
13 de dezembro - Dia do Cego
Tente enxergar através dos cheiros, dos sons e das mãos!
Camila Bertolazzi
Por Camila Bertolazzi
Faça uma experiência: feche os olhos e, por alguns minutos, tente enxergar através dos cheiros, dos sons e das suas mãos. A sensação é, no mínimo, muito desconfortável, como se você perdesse a conexão com o mundo ao seu redor. Foi justamente assim que se sentiu o aposentado Claudemir Cardoso Alves, de 37 anos, quando de repente a luz se apagou, e no lugar vieram a solidão e a insegurança.
O ex-funileiro perdeu a visão há 5 anos em um acidente de trabalho, que também lhe trouxe graves problemas de audição, no nariz e na boca. “Em um segundo minha vida mudou da água para o vinho; um vinho ruim que ninguém gostaria de provar”, conta. Claudemir é um dos cerca de 180 milhões de deficientes visuais em todo o mundo – 45 milhões são cegos, e o restante com baixa visão -, segundo dados recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Os países menos desenvolvidos são responsáveis pela maior parte. No Brasil, os dados sobre a quantidade de cegos não são exatos. O Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) contabilizou 148 mil cegos no país, 57 mil apenas no Nordeste. Segundo a OMS, a principal causa de cegueira no Brasil é a catarata, com aproximadamente 40% dos casos. Em seguida, aparece o glaucoma com 15%, a retinopatia diabética com 7% e a cegueira na infância com 6,4%.
Jesuíno Soares da Costa, de 45 anos, nasceu cego, mas sempre teve uma vida normal. Divorciado – de uma cega – e pai de um jovem com síndrome de Down, ele trabalha como revisor de Braille, onde descobriu a paixão pelos livros. “Lembro até hoje do primeiro livro que eu li, era do Monteiro Lobato. Eu entrei nele e viajei junto com os cavalos voadores”, relembra.
Agora a preferência são os romances. “As histórias mexem muito comigo, então quando estou lendo um livro ou assistindo um filme e surge algo violento, eu paro. Sei que o mundo é assim [violento], mas eu posso escolher, não posso?”, questiona. Outra paixão de Jesuíno é a música. “Já me falaram que eu deveria cantar profissionalmente, mas eu não canto por dinheiro, canto porque eu gosto, por lazer. Gosto de transmitir o que eu estou sentindo, e se não estou sentindo nada não adianta cantar”.
Camila Bertolazzi / www.itu.com.br
Jesuíno faz sucesso entre os amigos. Depois dessa apresentação exclusiva, os comentários foram muitos. “O Jesuíno deixa o Roberto Carlos no chinelo”, “Agora só falta gravar um CD”, “Ele só não fica rico porque não quer”... E Jesuíno agradece humildemente: “Não é algo para se dizer ‘ó, como canta esse menino’, mas...”.
Claudemir e Jesuíno se conheceram na Escola de Cegos Santa Luzia, onde convivem diariamente com outras 80 pessoas cegas ou com baixa visão. Apesar do nome, a psicóloga Márcia Abigair Caggiano, há nove anos na entidade, explica que o espaço é muito mais que uma escola, é um centro de habilitação e reabilitação, que além de acompanhar os alunos no dia-a-dia escolar, tem um cunho de integração. “O objetivo da nossa escola sempre foi de incluí-los [os alunos] na sociedade, oferecendo algo a mais do que é oferecido, e nunca confiná-los num universo restrito”, explica.
Para isso, a instituição conta com uma equipe técnica de Orientação e Mobilidade (ensina desde o caminhar sozinho até a prática de esportes), Terapia Ocupacional (habilidades básicas como trocar de roupa e amarrar o cadarço), Psicologia, Pedagogia, Professor de Braille, Serviço Social (assessoria familiar e auxilio na inserção no mercado de trabalho) e Oftalmologia. Os atendimentos são totalmente gratuitos.
Depois de passar o dia aprendendo, lendo, conversando e se divertindo, Jesuíno pega o ônibus e vai sozinho para casa. Ao chegar é recebido por Drieli, uma bicicleta de estimação, do signo de Áries, com dois lugares - um ao lado do outro. “A sensação é incrível; me sinto livre com o ar batendo no rosto”. Isso é uma novidade para ele e milhares de outros cegos, já que é mais seguro andar na garupa, onde o vento é, muitas vezes, bloqueado por quem está guiando.
Liberdade! Essa é a palavra chave que fazia parte da vida de Claudemir antes do acidente. “Antes eu era livre, era dono dos meus atos, e sentia vivo o meu coração”. Ele confessa que no início achou que sua vida tivesse acabado, mas hoje... “Eu tenho uma vida normal, pago minhas contas, faço compras, toco violão; a única diferença é que a maioria das pessoas enxerga com os olhos e eu não”.
> 13 de dezembro, dia dos cegos e de Santa Luzia
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