Caracterização preliminar da fauna cavernícola da Gruta do Riacho
Jéssica FerrariJonas Eduardo Gallão*, André Rangel Nascimento*, Rafael de Oliveira Xavier*, Bianca Rantin*, Diego Monteiro-Neto*, Luiza Bertelli Simões*, Mariana Schiavoni Pinto*, Ericson Cernawsky Igual**, Maria Elina Bichuette* *Universidade Federal de São Carlos **Grupo Pierre Martin de Espeleologia
O presente trabalho foi conduzido na Gruta do Riacho Subterrâneo localizada no município de Itu-SP, entre os dias 25 e 27 de setembro de 2010, como parte de disciplina de Pós Graduação “Ecologia de Cavernas” da Universidade Federal de São Carlos-UFSCar. A Gruta do Riacho Subterrâneo apresenta litologia granítica, pouco comum para sistemas hipógeos, sendo a sexta maior caverna em granito em termos mundiais (topografia em andamento com aproximadamente 1.249 metros de condutos em projeção horizontal; E. C. Igual, com. pess.).
Assim, estudos em cavernas nesta litologia são fundamentais para a proteção deste meio tão peculiar. Além disso, a gruta estudada apresenta grande número de entradas, possibilitando uma grande mobilidade de organismos entre o meio hipógeo e epígeo e também de itens alóctones que promovem a manutenção da fauna. No estudo foram feitas marcações de pontos amostrais, onde medidas de temperatura, luminosidade e umidade relativa do ar foram tomadas.
No total, foram estabelecidos 35 pontos amostrais, sempre tendo a entrada mais próxima como ponto de partida. Para a fauna terrestre, a composição e abundância foram determinadas para cada ponto amostral por meio de observações e coletas manuais de indivíduos e para fauna aquática, utilizou-se armadilha Surber para realização das coletas. O material coletado foi transportado ao Laboratório de Estudos Subterrâneos (UFSCar), no qual ocorreram triagem e identificação prévia. Após esta primeira fase, o material previamente triado foi enviado a especialistas de alguns grupos taxonômicos para identificação precisa.
Foram registradas ao todo 98 espécies, todos invertebrados (terrestres e aquáticos). Cabe ressaltar que não foi feito levantamento de espécies de morcegos, e, o número de espécies deve ser maior. Esta riqueza pode ser considerada elevada comparando-se com outros levantamentos realizados em outras cavernas no Brasil. A classe Insecta a mais rica (39 espécies), dentre a qual, as ordens registradas foram Coleoptera, Hemiptera, Hymenoptera, Diptera, Trichoptera, Lepidoptera, Blattaria, Orthoptera, Psocoptera, Ephemeroptera e Thysanura.
Cabe ressaltar que, para os besouros, três espécies pertencem à subfamília Pselaphinae e apresentam redução ocular, categorizando-os como possíveis troglóbios (organismos restritos ao meio subterrâneo). Outro fator interessante é a presença de estruturas radiculares abundantes penetrando na caverna em diversos pontos (gênero Phyllodendron, família Araceae).
Nestas raízes observamos associações de insetos hemípteros (fitófagos) e uma grande abundância e riqueza de himenópteros, todos da família Formicidae. A segunda classe mais representativa em número de espécies foi Arachnida, com 37 no total (muito similar ao numero de espécies de insetos), sendo que a ordem Araneae foi a mais rica dentre todas, com 30 espécies distribuídas em 15 famílias distintas.
Os ácaros foram representados por quatro espécies e os opiliões com apenas três espécies, no entanto, o gênero Goniosoma, organismo trogloxeno (dependente do meio epígeo para completar seu ciclo de vida), foi o mais abundante (cerca de 200 indivíduos, em uma única contagem no crepúsculo vespertino) entre todas as espécies registradas. Neste estudo preliminar, organismos troglófilos (organismos com populações no meio subterrâneo e superficial, completando aí seus ciclos de vida) foram extremamente abundantes e representados em sua maioria pelos aracnídeos (famílias Ctenidae, Pholcidae, Sicariidae, Theridiidae e Theridiosomatidae, dentre outras).
Em relação às aranhas outro fator nos chama a atenção, muitos dos indivíduos coletados eram jovens, evidenciando que a época reprodutiva ocorreu no início do período chuvoso. As outras Classes registradas no ambiente terrestre, com as respectivas Ordens, foram: centopéias Chilopoda (Geophilomorpha); piolhos-de-cobra Diplopoda (Polydesmida, Spirobolida e Spirostreptida); Entognatha (Collembola); caracóis Gastropoda (Pulmonata); tatuzinho Malacostraca (Isopoda) e uma espécie de planária terrestre Turbellaria (Seriata).
Para o ambiente aquático foram registrados caranguejos e anfípodes da classe Malacostraca (Brachyura e Amphipoda) e planárias aquáticas da classe Turbellaria (Tricladida). Além disso, foram coletadas ninfas de Hydropsychidae (Trichoptera) e de efemérides (Ephemeroptera), larvas de Chironomidae (Diptera) e Elmidae (Coleoptera) e adultos de Veliidae (Hemiptera), demonstrando uma riqueza considerada no ambiente aquático.
Para este estudo preliminar, no entanto, um fator relevante e impactante pode ter causado um viés nas amostragens de dados. Duas semanas antes das realizações das coletas, ocorreram queimadas na mata de entorno da caverna, o que pode ter afugentado, tanto pela fumaça quanto pelo fogo, os morcegos, além de ter influenciado na abundância de organismos troglófilos dentro da caverna, pelo menos quando consideramos as aranhas, na sua maioria em estágios juvenis.
Portanto, estudos em longo prazo são necessários para confirmação do status dos organismos registrados, além de obtermos dados adicionais para subsidiar a proteção tanto do meio hipógeo quanto do entorno da Gruta do Riacho Subterrâneo. Agradecimentos especiais ao Senhor Marcus Lerner, família e colaboradores do Camping Casarão.
*Texto do Boletim Eletrônico do GPME - Grupo Pierre Martin de Espeleologia