Cultura

Publicado: Quarta-feira, 16 de maio de 2007

Discurso em homenagem ao Dr. Hermelindo Maffei

14º aniversário de falecimento do Dr. Ermelindo Maffei.
 
Senhores
 
Numa triste tarde outonal, quando as folhas sopradas pelo vento caíam sobre as lápides, há catorze anos, viemos a esta necrópole sepultar o advogado, o decano da classe, o cidadão, o pai de família, o amigo de todos, cuja existência fora verdadeiro facho de luz na vida da comunidade, viemos sepultar – repito – o Dr. Ermelindo Maffei.
        
Eis que o cenário se repete: as folhas caem ao soprar do vento.
 
         « Quando cadran le foglie e tu verrai
         a cercar la mia croce in camposanto,
         in un cantuccio la ritroverai
         e molti fior le saran nati accanto.».
                                              Lorenzo Stecchetti
        
Os versos falam de flores, das muitas flores que enfeitam a morte. Nelas recolhemos as pétalas de saudade que agora desfolhamos em sua campa. Aqui estamos como integrantes de vários setores da sociedade aos quais o Dr. Ermelindo Maffei emprestou efetiva colaboração: Ordem dos Advogados do Brasil, Academia Ituana de Letras, Secretaria Municipal de Cultura, Sociedade Amigos da Cidade de Itu, Lar e Creche Mãezinha, Faculdade de Direito de Itu, Museu Republicano, Sociedade Padre Bento, Sindicatos de Trabalhadores, Imprensa e coloco agora um et cetera para não omitir outras entidades eventualmente não mencionadas mas que também contaram com sua presença participativa.

Neste instante de homenagem póstuma, minha mente se compraz em evocar lembranças vivas de traços marcantes da personalidade cidadã desse homem extraordinário que marcou presença em Itu e adjacências. Não passou pela vida “em branca nuvem”. Pelo contrário, sofreu e muito “o frio da desgraça”, na bela imagem do poeta. Nada porém arrefeceu-lhe o ânimo, a alegria de viver, o senso de humor.

Iniciei estas singelas palavras recitando versos de Stechetti, no original, por ser o italiano o idioma paterno de Ermelindo Maffei e ao qual recorria sempre, com bom humor e desenvoltura, quer no uso de expressões idiomáticas, quer mencionando adágios ou simplesmente citando o fraseado pitoresco do pai, o “oriundi” Gabriele Maffei. Assim deixou-nos a imagem de um amigo bem humorado que, ao narrar um fato jocoso, costumava rir antes mesmo do desfecho, o que levava o interlocutor a rir, também, por duas vezes. Dr. Maffei era dotado da virtude do bom humor. E, no dizer de Comte-Sponville, “não ter bom humor é não ter humildade, é não ter leveza, é não ter lucidez, é ser demasiado cheio de si...” O homem orgulhoso é sério. O bom humor quebra o orgulho, desarma a seriedade, como também desarma “o ódio, a cólera, o ressentimento, o fanatismo, a mortificação e até mesmo a ironia”. São sentimentos que não têm lugar na prática da cidadania. E o cidadão Ermelindo Maffei não os cultivava.

Por outro lado, nesta oportunidade, quero ainda registrar outra grande virtude de Ermelindo Maffei: a bondade. Era o protótipo do homem bom, generoso, valores muito mais ligados ao coração ou ao temperamento do que à razão.

“Certa vez” – contava-me um amigo, “estava numa dependência do Fórum, quando ouvi, partindo do corredor, a voz inconfundível do Dr. Maffei, conversando demoradamente com alguém. Ao sair, procurei constatar a quem se dirigia o velho advogado, esclarecendo uma questão com tanta paciência e atenção. Julguei tratar-se de um cliente importante, poderoso, desses que praticamente sustentam a banda do advogado com causas de grande valor. Ledo engano. O doutor dirigia a palavra a um homem simples, humilde, mal trajado, certamente beneficiário da justiça gratuita.” E o meu amigo concluiu: “Que homem bom é esse doutor Maffei!”

A observação aqui registrada me foi narrada há anos, por pessoa estranha à comunidade ituana, que mal conhecia Ermelindo Maffei. Nós, outros, porém, que participávamos do seu amistoso convívio, sabíamos o quanto a generosidade e a bondade representavam atributos sempre presentes em sua conduta, mais evidenciada na paciência e na tolerância dispensadas aos humildes.

No Patronato, ele era a voz que jamais faltava aos que não a possuíam para o acesso à justiça. Ao lutar por esta, melhor que ninguém o laborioso advogado sabia que eticamente as causas não devem ser divididas em grandes e pequenas, mas em justas e injustas. Reportava-se ao preceito de Couture: “nenhum advogado é rico para recusar questões justas porque sejam pequenas, nem tão pobre para aceitar causas injustas porque sejam grandes.”

Todavia, se às vezes a justiça se tornasse um combate sem fim, inatingível, valeria por certo o preceito do poete Martins Fontes:
        
         “Se a justiça é impossível, sê bondoso,
         Que de ser bom, ninguém se arrependeu.”
        
Senhores,

A virtude nos homens reside mais nas ações e nos exemplos do que nas palavras. E o homenageado era homem de incontáveis realizações. Sua voz cara emudeceu mas na palpitação dessa vida extinta ainda o podemos sentir nos episódios, nos ecos e nos cenários dessas realizações. Aprendemos com o Cristianismo que os a
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