Publicado: Sábado, 15 de julho de 2006
Conversando com José Pacheco
Imagine uma escola que pergunta: o que você quer aprender?
Deborah Dubnerpor Deborah Dubner
“... Era uma Escola muito engraçada, não tinha paredes, não tinha (quase) nada. Ninguém podia fazer as provas, porque as notas não diziam nada....”
Imagine que é o seu primeiro dia de aula em uma nova escola. Você chega e pergunta: onde é a minha sala? Quem é a minha professora?
Perguntas corriqueiras para um aluno que chega a uma escola desconhecida. Mas nessa escola as respostas são bem diferentes do que é comum. Suas salas não têm paredes e os professores estão espalhados pelos quatro cantos, com a única missão de orientar o seu aprender. E a pergunta que te fazem é: o que você quer aprender?
Alguém já lhe fez essa pergunta algum dia? Você - que é mãe, pai, professor, estudante, executivo, médico, psicólogo, diretor, avô, filho – já se perguntou o que quer aprender?
Assim começa um dia na Escola da Ponte, em Portugal. Um plano de trabalho muito bem definido é feito por cada aluno, com orientação dos professores-tutores. De acordo com o que cada pessoa quer aprender, é elaborado um caminho de aprendizagem, seguindo o modelo educacional que cada criança necessita. “O melhor método é o que dá resultado para cada criança” – explica Pacheco, que deixa claro não gostar de modismos educacionais e receitas prontas. Idealizador dessa escola e grande visionário em educação, José Pacheco esteve em Itu no dia 12 de julho, compartilhando sua experiência de mais de 30 anos com educadores, pais e profissionais em geral. Trazido pelo Colégio Almeida Junior, Pacheco inundou o auditório da escola com exemplos vivos de sabedoria e conhecimento.
As mais de 200 pessoas que estiveram presentes no encontro não conseguiram sair sem se fazer as perguntas: “Será que estou ensinando certo? Será que estou aprendendo com os meus alunos? Será que estou deixando a sabedoria das crianças acordar a minha mente? Será que não estou me acomodando atrás dos livros e relatórios sem movimento? Será que o vestibular é mesmo o mais importante? Será que meus filhos estão sendo preparados para a vida? Será que estou despertando o desejo de aprender, ou varrendo a curiosidade para dentro de um baú mofado? Se eu tivesse aprendido assim, eu seria mais preparado para atingir meus objetivos de vida hoje?”
Essas e tantas outras perguntas passaram – certamente - pela cabeça de quem lá estava, ouvindo as histórias de José Pacheco. O tempo transcorreu muito além dos ponteiros, quase como num piscar de olhos. Quando se faz o que se gosta é assim, a gente nem vê o tempo passar. Diferente das intermináveis aulas onde as crianças esperam ansiosamente o som do sinal para sair correndo da classe.
A Escola da Ponte não é uma utopia e, embora pioneira, não é a única. A cada dia que passa mais pessoas – no Brasil e no mundo - acordam para a urgência de um novo modelo educacional, que privilegia a formação do ser humano, menos ancorado em fórmulas vazias e mais amparado por uma confiança no coletivo e pelo senso de humanidade. O Colégio Almeida Júnior, que acredita em uma proposta educacional inovadora, tem trazido educadores pioneiros para oferecer experiências transformadoras para pais, educadores e alunos da cidade de Itu.
Assim como outros profissionais que sabem ver com os olhos da alma e têm coragem para transformar seu idealismo em realidade, José Pacheco soube trilhar o caminho da ousadia e resiliência, apesar dos inúmeros obstáculos que um percurso pioneiro é capaz de gerar.
Apaixonado pela educação, mergulhou nos diversos sistemas de aprendizagem, psicologia, arte, comunicação e ciência. Uma boa dose de humor e humildade foram ingredientes essenciais à sua prática de 30 anos, aliados aos fundamentos teóricos consistentes e comprovadamente reconhecidos pelo sistema educacional de Portugal. “Nossos alunos, em termos acadêmicos, têm as melhores notas. São os que melhor pesquisam e ensinam os outros”, confirma Pacheco.
Mas nem por isso o caminho é fácil. Em Portugal, a Escola da Ponte é uma constrangedora realidade para o ensino público e gestão educacional, primeiro porque ela faz o contrário de todas as diretrizes oficiais e depois porque ela está em primeiro lugar na avaliação do "provão" de lá. Conquista essa que – como se pode imaginar – causa inúmeros problemas em relação ao mercado.
Mesmo no Brasil, não deixa de ser incômodo saber sobre os resultados que essa escola apresenta. Afinal, os principais fundamentos educacionais que sustentaram por tantos anos a aprendizagem do nosso mundo caem por terra. Nossas certezas são chacoalhadas por perguntas difíceis de responder e somos convidados a refletir: “O que eu realmente sei”? e “O que eu quero aprender”?
Portanto, para quem prefere continuar na agradável zona de conforto, uma conversa com Pacheco não é um bom remédio. Pelo contrário, é um convite a uma boa dor de cabeça. Por outro lado, para pais e educadores que querem filhos e alunos pensantes, dignos de humanidade e que anseiam por construir um mundo mais justo para se viver, está aí uma oportunidade única. Quando menos esperamos, nossas paredes também caem e vislumbramos um novo jeito de ensinar e aprender, além das fronteiras de nossas próprias inseguranças. Simples, por ser natural. Complexo, por ser incomum. Mas certamente, nos faz mais felizes. E, como diz Pacheco: “Na educação é assim: acreditar, agir e as coisas acontecem.”
Dicas de leitura:
- A Escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir, Rubem Alves, 120 págs., Ed. Papirus.
- Escola da Ponte – Um outro caminho para a Educação, José Pacheco, Didática Suplegraf.
- Quando eu for grande, quero ir à Primavera, José Pacheco, 109 págs., Ed. Didática Suplegraf.
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