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Conversando com Rubem Alves
por Deborah Dubner

Alan Dubner / www.itu.com.br
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O escritor e educador Rubem Alves com
a psicóloga e jornalista Deborah Dubner

“O aprendizado ‘a fim de’ passar nos vestibulares – aprendizado que é logo esquecido, passado os exames – poderia ser substituído pelo aprendizado em função do prazer e da utilidade. E assim se iniciaria o cultivo do tipo de inteligência essencial ao desenvolvimento da Ciência: só é bom cientista aquele que pensa como brinca” (Rubem Alves)

Como se ensina compaixão? Como se ensina mansidão? Como se ensina a ternura? Essas foram as colocações provocativas de Rubem Alves, escritor, psicanalista e educador, em um encontro íntimo com mais de 40 profissionais das áreas de educação, saúde e psicologia, realizado em Sorocaba no dia 02 de dezembro. Organizado pela psicóloga Verônica M. Hoffman, do consultório de psicologia, o evento contou com a presença de pessoas de Sorocaba, Itu, Tatuí e Cerqueira Lange, entre outras cidades vizinhas.
A educação no Brasil é uma questão que vem preocupando pais, professores e alunos de maneira geral. Enquanto a maioria das escolas particulares privilegia o ensino voltado para o mercado competitivo e as escolas públicas não conseguem nem entrar nessa correnteza, algumas “ilhas” de profissionais inquietam-se com o futuro da humanidade que as escolas estão ajudando a formar. Rubem Alves faz parte dessa minoria angustiada, que apesar das dificuldades não perde a paixão por ensinar e aprender.
“É preciso criar uma sociedade mansa, uma cultura de paz – alerta Rubem – e as escolas não sabem como fazer isso. As escolas não se sentem livres para fazer o que os educadores acreditam, porque os pais exigem e as escolas ficam com medo de perder alunos.”
Para Rubem, que em sua diversidade profissional é membro da Academia Campinense de Letras, professor-emérito da Unicamp, cidadão-honorário de Campinas e psicanalista pela Sociedade Paulista de Psicanálise, o fundamental é ensinar a reverência pela vida, porque a vida de cada um é sagrada e todos só estão em busca de alegria. “Mas as escolas não sabem ensinar isso”, lamenta.
A violência está em toda parte, as crianças e adolescentes são humilhados com apelidos e atitudes que os marcam para sempre, mas os professores não acreditam que isso é responsabilidade deles. Assim, continuam a segregação, os anos de humilhação que geram o desejo de vingança, que por sua vez aumenta a violência. É um ciclo vicioso que se auto-alimenta. Os pais não querem se sentir para trás e muitas vezes, mesmo sem entender de educação, fazem exigências que são baseadas apenas em conversas com outros pais e comparações. Nesse sentido, Rubem comenta: “toda a nossa infelicidade se inicia na comparação, que é base da inveja. Um pai quer que seu filho aprenda a ler porque o filho de outra pessoa já aprendeu, e não porque é importante para o filho naquele momento!”.
Atualmente, sabe-se sobre a vital importância das emoções para o aprendizado. Se antigamente o Q.I era o ponto de referência para professores e psicólogos, atualmente não há discussão sobre o impacto que as emoções têm no desenvolvimento de cada ser humano (Q.E). Mas se é assim... porque as escolas ainda insistem em ensinar conteúdo sem provocar experiência, passando conhecimentos inúteis para o teste no vestibular? Porque a escola não se concentra nos interesses dos alunos – base fundamental para o aprendizado – em vez de chegar com uma carga de material pronta para ser despejada?
“A experiência amorosa na escola é o que transforma a pessoa” – diz Rubem. A consciência nasce da experiência. Mesmo que a pessoa experimente essa consciência, quando está no grupo, ela perde a consciência individual. É como se, por estar no grupo, a pessoa se sentisse liberada da ética.” – afirma. As escolas, portanto, devem aprender a trabalhar o indivíduo no grupo e o grupo com o indivíduo, para criar a consciência do coletivo, o senso de ética e a experiência amorosa que vai interferir na criação de uma sociedade de paz. No livro “Fomos Maus Alunos”, em co-autoria com Gilberto Dimenstein, os autores revelam experiências de suas vidas e o papel da escola no desenvolvimento de sua aprendizagem. São depoimentos vivos e extremamente atuais, que instigam o leitor a muitas indagações e reflexões.
Essas discussões permearam o encontro que durou mais de 4 horas, deixando os presentes com muito mais perguntas e inquietações do que respostas. No entanto, todos saíram com a clara percepção de que a mudança na educação é urgente e que não se pode perder a esperança e a fé.

Alguns dos livros de Rubem Alves sobre Educação

Pinóquio às Avessas (2005)
Recriando a trajetória de Pinóquio, o famoso boneco do autor italiano Carlo Collodi, Rubem Alves nos oferece uma nova leitura - Pinóquio às avessas.
Nesta versão ele aponta para o perigo que correm nossas crianças ao ingressarem em escolas que não consideram o seu potencial e suas capacidades individuais e criativas, tentando enquadrá-las num sistema educacional rígido, conservador, anacrônico e sufocante.
O conto é, assim, apresentado "às avessas" para provocar uma reflexão que suscite mudanças significativas em favor de uma educação verdadeira, edificante, que preserve na criança - no ser humano - a capacidade de sonhar, de criar, de transformar, de se realizar.

A escola que sempre sonhei, sem imaginar que pudesse existir (2005)
Escola da Ponte: um único espaço compartilhado por todos, sem separação por turma, sem campainhas anunciando o fim de uma disciplina e o início de outra. A lição social: todos partilhando de um mesmo mundo. Todos se ajudam. Não há competição. Há cooperação. E assim vão as crianças, aprendendo as regras da convivência democrática, sem que elas constem de um programa....

Aprendiz de Mim – Um Bairro que virou Escola (2004)
Imagine um bairro se transformando numa escola a céu aberto, formado por trilhas educativas conectadas a salas de aula. Desaparecem as fronteiras entre a comunidade e escola. Aprende-se a qualquer momento e em qualquer lugar - oficinas mecânicas, praças, cinemas, becos, cafés, livrarias, danceterias, museus - e com qualquer pessoa. Crianças e adolescentes transformam, com intervenções de arte, muros, calçadas, postes, delimitando novos espaços de conhecimento. Essa proposta de bairro-escola, desenvolvida na Vila Madalena, em São Paulo, foi considerada uma referência mundial de educação pela Unesco e pelo Unicef, atraindo crescente interesse de educadores de dentro e fora do país.
Rubem Alves escreve sobre o prazer que sentiu ao fazer incursões nessa experiência, revelando inusitados personagens. Aprendiz de mim é um misto de repostagem, poesia e autobiografia guiadas por quem faz dos mistérios da vida um permanente encanto.

Ao professor, com o meu carinho (2004)
Rubem Alves, com seu estilo peculiar e contundente, traz à tona algumas das críticas que vem apresentando, ao longo do tempo, ao sistema educacional. Quem o conhece de perto sabe que suas críticas são a manifestação de uma ansiedade profunda por ver oferecida a nossos alunos uma educação mais justa, por meio da qual também o professor possa se realizar em sua vocação de mestre.

Fomos Maus Alunos (2003)
Gilberto Dimenstein e Rubem Alves são de gerações diferentes, viveram realidades distintas em termos de ambiente, costumes, família, religião. Mas há um importante ponto em comum entre eles - ambos tiveram a experiência da diferença, da rejeição. Ambos quebraram paradigmas e acabaram construindo sua própria educação. Nesta obra, os autores nos convidam não apenas a pensar nossa educação, como também a retomá-la em nossas mãos.

Estórias de quem gosta de ensinar (2001)
O livro reúne as seguintes crônicas sobre educação - 'O País dos Dedos Gordos', ' Vestíbulo Coisa Nenhuma!', ' A Maratona Safada', ' Eu Ficaria de Fora...', ' O Sorteio', 'Muito Cedo para Decidir', ' Viagem Longa', ' Destino Incerto...', ' A Inutilidade da Infância', 'Os Grandes contra os Pequenos', ' O Avesso', ' O Currículo dos Urubus', 'O Urso Burro', 'OiuqóniP', 'Urubus e Sabiás', 'O Sermão das Aves', 'Saber e Prazer', ' Amor ao Saber', 'A Lâmina da Guilhotina', 'A Verdade do Espelho', 'O Que as Ovelhas Dizem dos Lobos', 'A Imaculada Conceição', ' Não Era Esta a Mágica Quer Eu queria', 'Aprendendo das Cozinheiras', 'Monjolos e Moinhos', 'Seminário - Espalhando Sêmen', 'Escola - fragmento do futuro'.

E ai? - cartas aos adolescentes e aos seus pais (1999)
Uma coleção de cartas que Rubem Alves escreveu aos adolescentes e a seus pais. São cartas francas e alegres onde ele provoca os adolescentes falando sobre a amizade, o amor, a leitura, a música, as drogas, as razões de viver, o heroísmo.

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