Guerreiros de fé! Romeiros demonstram sua devoção em ruas ituanas
O destino final dos caminhantes é Pirapora do Bom Jesus.
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Por Renan Pereira
Eles vêm de cidades distantes, andam apressadamente, comem mal, dormem pouco e quase não tiveram tempo para responder as perguntas que compuseram esta reportagem. De quando em quando, soltam um grito em uníssono, que ressoa em toda a avenida, fazendo menções ao nome de Jesus Cristo. Eles são os romeiros!
Faça chuva ou faça sol, estes guerreiros da fé estão sempre lá, dispostos a seguir em frente. Carregam cruzes que chegam a medir dez metros de comprimento e ignoram os olhares curiosos que os tomam por onde passam. Viajantes de variados municípios da região passam todos os dias da Semana Santa pelas ruas de Itu com um único destino: Pirapora do Bom Jesus. É lá que eles farão suas demonstrações de fé, devoção, pedidos e agradecimentos a suas principais figuras de crença.
Alguns são religiosos fervorosos, outros nem tanto. Muitos deles praticam o ritual simplesmente para acompanhar amigos ou para desafiar os limites da fé. “Eu acredito muito em Deus e também faço os meus agradecimentos, mas desta vez vim somente para acompanhar meus amigos, que foram concebidos com milagres e estão pagando promessa”, afirma o jovem Paulo Roberto.
Junto com Paulo, um grupo de aproximadamente oito pessoas cumpre o percurso. Eles saíram da cidade de Cesário Lange no dia 28 de março (domingo), às 14h30. O romeiro, Luis Carlos, conta que pratica o ritual há muito tempo e que o grupo está ansioso para a chegada. “Pretendemos chegar lá [Pirapora] na quinta-feira de manhã". E completa: "Pratico esse ritual há muitos anos em agradecimento ao Senhor Jesus, pois tive um problema grave na coluna, mas agora já estou curado”.
O líder dos caminhantes avisa que já estão atrasados e têm que ir embora. Despeço-me deles e mais à frente encontro outro grupo de cidades variadas. Quem conversa comigo primeiro é José Augusto, morador de Porangaba e um dos romeiros mais antigos da cidade. Segundo ele, a cruz que o grupo trouxe desta vez mede nove metros. O objetivo é chegar aos 17. “Cada ano que faço essa viagem aumentamos um metro na cruz. Tenho mais 8 anos de promessas para cumprir", diz.
De acordo com o romeiro da cidade de Tatuí, Marco Chiconato, quando os grupos chegam à cidade de Pirapora, todas as cruzes são doadas. “Normalmente as madeiras são doadas para construções de andaimes em igrejas, para pessoas conhecidas da cidade, ou mesmo para pessoas carentes que, de alguma forma, aproveitam o material".
A fé move montanhas
O roteiro dos romeiros é longo e cansativo. Segundo Mauri Martins, representante do grupo de Cesário Lange, Boituva e Porto Feliz já haviam sido deixadas para trás. Os próximos passos seriam Cabreúva, Bananal e finalmente Pirapora. “Ainda falta muita estrada, nosso percurso é longo, e normalmente dormimos durante à noite e caminhamos durante o dia”.
Ele conta ainda que seu grupo é ajudado por patrocinadores, além de receber ajuda da prefeitura local. “São pessoas de muita fé e que não podem comparecer. Eles nos auxiliam com alimentos e água”.
Normalmente, os romeiros dormem em pousadas ou lugares improvisados. Os que não recebem nenhum tipo de apoio se viram como podem. O maior gasto, normalmente, é com comida, já que a água quase todos levam. O Sr. João Arruda, conhecido romeiro da cidade de Porangaba, falou sobre a sua experiência na romaria. “Essa é a nona vez que vou à Pirapora. Nas primeiras vezes que vim eu tinha uma doença muito grave, depois continuei vindo porque eu gosto muito disso".
Milagres
João Arruda explica que este ano a promessa tem um motivo especial. “Meu sobrinho descobriu que estava com um grave problema no coração. Rezei muito a Deus e fiz muitas promessas. Semanas depois o levamos a outro médico e ele já não tinha nada”. Samuel Costa, de Tatuí, contou um caso parecido. “Meu sobrinho sofria de meningite e foi curado, este é o quarto ano que venho para cá carregando esta cruz”.
Mauri Martins também garante ter sido abençoado por forças divinas. “Tive uma infecção terrível no intestino. Fui a muitos médicos e nenhum deles soube me explicar o que era a minha doença. Pedi muito ao Bom Jesus de Pirapora e Nossa Senhora de Fátima para que fosse curado. A ferida cicatrizou pouco tempo depois, sem a ajuda de médicos ou remédios. Hoje estou firme para prosseguir meu caminho”, brinca.
Uma das histórias mais impressionantes dos romeiros partiu de Alexandre Martins. “A sugestão de trazer uma cruz para cá foi do meu avô. Mas ele morreu quando estava indo comprar as madeiras, poucos dias antes da viagem. A partir daquele momento, resolvi que levaria isso adiante. Agora carregarei a cruz todos os anos em homenagem a ele”, disse. Em respeito ao avô, o jovem escreveu os seguintes dizeres na cruz: Pai, eternas saudades vão ficar. Descanse na paz de seus filhos. “Acredito que, no fundo, ele já sabia que não viveria por muitos dias, e por isso tinha vontade de fazer o ritual pela última vez”, finaliza.