Festivais se reinventam e abraçam a bandeira verde no século XXI
A estratégia tem conquistado multidões de seguidores.
Renan Pereira
Por Renan Pereira
Pegue um pouco de arte. Adicione uma quantia elevada de entretenimento e uma boa dose de ecologia. Pronto. Você tem aí uma fórmula de sucesso e que tem sido usada como ferramenta pelos mais diversificados movimentos individuais do globo. É fato: cada vez mais, no Brasil e no mundo, empresários e publicitários usam essa “arma” para atrair legiões e legiões de seguidores. Só em Itu, ganhamos dois festivais de grande porte voltados a estes conceitos neste ano: o Respect (evento de música eletrônica que fez alusão ao Ano Internacional da Biodiversidade nesta edição) e o SWU Music And Arts Festival (movimento criado pelo publicitário, Eduardo Fischer, que tem como um dos principais bordões a questão da sustentabilidade).
Apesar da aparente força com que chegou essa ideologia aqui nas Américas (representada principalmente pelo Coachella Fest – Califórnia / EUA), a nova “mania” ganhou energia há pouco e podemos encontrar suas raízes lá do outro lado do oceano. O Glastonbury Festival, evento que acontece periodicamente na Inglaterra, é um dos pioneiros dessa fórmula, reunindo os mais diversificados segmentos de arte, entretenimento e ecologia. Influenciado pelo movimento hippie dos anos 70, o festival é tido hoje como um dos principais expoentes de representatividade ambiental no mundo; além de ter se tornado conhecido universalmente por reunir milhares de pessoas e artistas em prol de um mesmo ideal.
E a lista não acaba aí. Só para citar mais alguns, ainda neste ano teremos no Brasil o Planeta Terra (que contará com a apresentação inédita do Smashing Pumpkins) e o Natura About Us (Snow Patrol e Air são algumas das atrações); ambos defensores bandeira verde, ainda que com pontos de vista diferentes. Parece, portanto, que o mundo está criando, ainda que vagarosamente, um novo tipo de consciência para lidar com este tipo de questão – seja no campo das políticas públicas ou da produção de conhecimento. Com isso, o ato de fundir elementos de diferentes mundos ideológicos se tornou algo habitual no século XXI.
Segundo Patrícia Otero, coordenadora da ONG 5 elementos, essa nova visão espacial tem uma explicação histórica. “Os problemas ambientais das últimas três décadas finalmente foram entendidos pela sociedade como uma ameaça tanto ao patrimônio natural brasileiro quanto às pessoas. Unir cultura e meio ambiente contribui bastante para que a causa ambiental seja internalizada e a sustentabilidade seja inserida. O slogan do SWU (Começa em você), por exemplo, vem de encontro com um princípio da educação ambiental, que é você ser responsável pela sua mudança de hábitos e atitudes no seu dia a dia; ali na campanha do movimento tem umas dicas rapidinhas e práticas”, explica. Leia aqui a entrevista completa.
Elevado número de ambientalistas e defensores empíricos do meio ambiente acredita no caráter social desse tipo de atitude. Há controvérsias... é claro. Como mostra o jornalista e mestre em comunicação empresarial, Paulo Stucchi, nem sempre ações de porte privado são levadas a sério quando o assunto é meio ambiente. “Ter consciência sustentável e ecológica é um mérito. O problema é que, do ponto de vista empresarial, muitas organizações usam essa bandeira como marketing. Isso se deve a dois motivos: benefícios junto ao governo e a vigilância da sociedade e da mídia, que cresceu a um expoente infinito com a internet. Ou seja, hoje, ter atitudes sustentáveis, produtos verdes, é, acima de tudo, uma estratégia de valorização da marca”. Leia aqui o depoimento na íntegra.
Outro fator interessante de se notar é que grande parte dos movimentos que dirigem para esse sentido, normalmente, é voltada ao público jovem. Estariam as novas gerações criando uma visão diferenciada de construção ambiental da sociedade? Para Patrícia, a resposta é sim. “A nova geração já cresceu midiática e isso facilitou o acesso a informações, a mobilização em redes e também à construção de novos conhecimentos. Acredito no potencial transformador dos jovens de hoje que, com seus sonhos, trazem esperança e encantamento por um mundo mais justo, com um consumo sustentável e equilíbrio ambiental”, opina.
Tese que o ambientalista Gabriel Bitencourt reforça. "A situação aponta um crescimento da conscientização ambiental. As pessoas, talvez, ainda não consigam se desapegar de práticas ambientalmente impactantes em seu dia-a-dia, porém se lhes forem apresentadas atividades, produtos ou serviços que 'compensem as emissões de carbono', que dêem destino ambientalmente adequado aos resíduos gerados ou qualquer outro 'atrativo verde', acabam sendo atraídas. Especialmente a juventude, esta já nasceu e cresceu sob o signo da sustentabilidade socioambiental".
De fato, uma pesquisa realizada recentemente pela Coordenação-Geral de Educação Ambiental da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC) desvenda a alta taxa de participação dos jovens nas chamadas CJ do Meio Ambiente (conselho jovem). A análise retrata também o aspecto destes cidadãos, demonstrando inclusive os perfis que são mais atuantes dentro da proposta: 39% deles são estudantes universitários, 30% estão na informalidade e 29% exercem trabalhos remunerados. Os oriundos de famílias de baixa renda - até cinco salários mínimos – somam 51% - o que indica que o grau de instrução é fator relevante quando se trata de visão de mundo crítica (neste aspecto).
O debate prossegue, mas não nos restam dúvidas. Em nenhuma outra década se deu tanta importância ao assunto meio ambiente como nessa. Além disso, movimentos internacionais como a COP 15 e o Protocolo de Kyoto, antes mesmo de resolver qualquer problema socioambiental, pelo menos colocam em evidência que questões como desmatamento e aquecimento global existem. E enquanto festivais como Glastonbury e SWU estiverem propiciando debates de temas como estes, com certeza, eles serão bem vindos entre nós. Afinal, trata-se de uma ferramenta a mais para reverter o quadro.